
A apresentação ibérica da QJMOTOR SRK400 no sul de Espanha permitiu-nos entender um pouco melhor a invasão que está a ser protagonizada pelas marcas chinesas e o que se poderá esperar desse fenómeno.

- Texto: Fernando Pedrinho
- Fotos: Álvaro Prieto, Polestar, Volvo, Benelli, QJMOTOR

A presença de dois altos responsáveis da Moto Bordoy, Alessandro Bifano (diretor de marketing e comunicação) e Carlos Lopez-Navarro (diretor comercial) na apresentação dinâmica da QJMOTOR SRK400, permitiu-nos descodificar o porquê da aposta neste modelo para primeira apresentação da marca chinesa, quando na sua gama existem as mais apetitosas motos de aventura de 800cc.
Até porque o italiano – radicado na Catalunha desde há 15 anos quando trabalhou com a Derbi, debaixo da esfera Piaggio – e o catalão não se fizeram rogados e também acompanharam os ensaiadores da comunicação social na estrada, para captarem o máximo de impressões sob esta ‘streetfighter’ apontada aos encartados do segmento A2.

O universo Geely
Integrada no conglomerado Qianjiang Motor, que é um dos maiores fabricantes chineses de motociclos, a QJMOTOR faz parte da ‘galáxia’ Zejhiang Geely Holding Group, um colosso da indústria automóvel. Que integra marcas tão diversificadas como a própria Geely, mas sobretudo as renomadas Volvo, Polestar e Lotus, a que se juntam Geometry, Lynk & Go, Proton assim como a gestão conjunta com a Mercedez-Benz AG nos citadinos Smart.
De forma alguma passa despercebida a irmandade que a une à Benelli, que a Qianjiang Motor adquiriu em 2005 e fez levantar o sobrolho de muitas marcas há muito estabelecidas, já antevendo o que iria suceder no ano seguinte na indústria das duas rodas e muitas outras.

“Acima de tudo este posicionamento permite à QJMOTOR a partilha de compras e componentes com as outras marcas do grupo”, como referiu Carlos Lopez. Além disso, permitirá beneficiar dos avanços produzidos pelas marcas automóveis do universo Geely, com destaque para os sistemas de gestão eletrónica e segurança, mas também na eletrificação.
“Se reparares, assistimos a uma transição dos fabricantes chineses de produtores para terceiros (OEM, ou fabricante original de equipamento’) para passarem a ter a sua marca própria”, fez notar Alessandro Bifano.

Um espaço para todos!
É esta a missão da Motos Bordoy para a implementação da QJMOTOR no mercado ibérico. “Um espaço para todos significa dar muita atenção ao público jovem, que muitas vezes deixamos de fora da paixão pelas motos, e que serão os nossos futuros clientes. Os jovens chegam com menos tiques de marquismo”, assinala de forma perspicaz Carlos López, referindo-se à menor importância que os mais recentes motociclistas atribuem à marca de um determinado modelo que lhes interesse. “Isto não se passa só com as motos. Este espírito, de mente aberta, também se estende às suas escolhas de telemóveis, carros ou televisões” remata o responsável comercial da Motos Bordoy.
“Foi isso que nos levou a apostar na QJMOTOR SRK400 como modelo de lançamento”, recordou Alessandro Bifano, “e não na mais espetacular SRT800”, a maxi-trail casa chinesa. “A SRK400 está muito alinhada com os nossos propósitos e com o trajeto de ascensão de um cliente dentro da gama QJMOTOR”, concluiu.

Partir pedra sobre um potencial bestial
O entusiasmo destes dois elementos da Motos Bordoy é evidente, mas não os leva a embandeirar em arco perante a tarefa e os desafios que têm pela frente para expandir e consolidar a QJMOTOR no mercado ibérico. “Como fizemos com a SYM há 18 anos, não esquecemos o que é partir pedra e, obviamente, não esperamos ter filas de clientes à porta dos nossos concessionários”, disse Carlos Lopez com um sorriso.
“O potencial da marca é bestial e não podemos esquecer a quantidade de modelos que temos na gama. Até já dissemos à fábrica que nos dê um pouco de fôlego! Não podemos assumir tanto produto assim de chofre num mercado em que acabámos de lançar uma nova marca”, fez questão de salientar.

Começar com algo mais fácil?
Poderia a Motos Bordoy lançar-se à conquista ibérica com uma gama mais restrita e fácil de vender? “Provavelmente sim”, anuiu Carlos Lopez. “Poderíamos ter começado com algo mais fácil e comestível pelo mercado. Mas não fomos pelo mais fácil, que seriam as ‘scooters’. Se o fizéssemos iriamos contra a imagem que queremos dar da QJMOTOR. Uma marca potente do grupo Geely, o qual tem no seu portefólio a Benelli e toda a tecnologia automóvel à disposição. Por isso, e com toda a humildade que nos assiste, decidimos dar o peito às balas com base na gama que temos à disposição e demonstrar isso mesmo: que somos uma marca de motos!”.

Chinesa? E então?…
O estigma do ‘made in China’ ainda surge muito associado aos fabricantes deste país em diversas áreas industriais, e a das duas rodas não constituem exceção. Muitos motociclistas demonstram ainda sentir muita desconfiança sobre modelos fabricados na China continental (já que a Formosa, ou ‘Taiwan’ se preferirem, é outra história), seja ao nível da qualidade e fiabilidade, mas sobretudo da segurança.
Chinesa? E então? Foi a provocação lançada nas duas apresentações ibéricas da QJMOTOR, em Lisboa e Madrid. “Fizemo-lo com contundência e atrevimento”, assumiu Alessandro Bifano. “Um telefone Xiaomi vale 800 euros e neste segmento de produtos, assim como noutros, a perceção do ‘made in China’ muda completamente”. A Motos Bordoy não se esconde atrás da origem da QJMOTOR e assume abertamente essa condição. O mercado dará a resposta se essa confiança é merecida.

Porquê arrancar com a SRK400?
Com uma gama que inclui os muito apetecíveis e vistosos modelos de Aventura 800cc, as ‘naked’ de média cilindrada e ‘custom’ de cilindrada inferior, a aposta inicial na QJMOTOR SRK400 como ariete de entrada no mercado ibérico não deixou de levantar as mais variadas questões. “A SRK400 parece-nos o modelo mais coerente para começar a nossa jornada em Espanha e Portugal. Pretendemos ser uma marca diferente, com uma linguagem nova e um padrão distinto. Nesse sentido pretendemos criar um espaço para todos e sobretudo para os novos motociclistas. E que modelo melhor que uma A2 de média cilindrada para o fazer, em face do fenómeno curioso que tem vindo a unir gerações”, sintetizou Alessandro Bifano.

Um fenómeno curioso
Mas que fenómeno unificador é esse? Carlos Lopez deu-me a resposta. “Atualmente, vemos que os motociclistas de modelos de maior cilindrada estão num processo de ‘downgrade’ numa fase mais avançada. Seja por questões de valor de seguro, de imposto de circulação, de elevado peso das suas motos ou, tão simplesmente, pela real necessidade”. Isso já levou a uma migração massiva, num passado não muito longínquo, das super-desportivas para as maxi-trail. E agora vemos as ‘naked’ e trails de média cilindrada a ganharem enorme importância em termos de vendas.
“Para além disso, a categoria A2 é a porta de entrada para os utilizadores que saem das 125cc de iniciação. Foi perante este cenário que pensámos: porque não vamos por aqui? Por outro lado, é nas médias cilindradas que percebemos o peso do ‘marquismo’ é inferior ao do que sucede nas oitocentos.
A garantia de seis anos, em que metade desse período é assumido pelo importador e não por uma companha de seguros associada, como fez questão de frisar Paulo Anjos, o diretor geral da Motos Bordoy Portugal, será um chamariz e uma paz de espírito para quem optar por um modelo desta nova marca. “É totalmente gratuita e não acresce ao preço, ao contrário do que sucede com outras marcas”.

A última a chegar
É um fato indesmentível. A QJMOTOR é a marca mais recente a chegar ao mercado, deparando-se com concorrentes, muitas delas também originárias da China. Marcas bem estabelecidas, com pergaminhos e provas dadas à sua clientela. “Com toda a franqueza e prontidão: uma marca nova que se apresenta num mercado tão competitivo, ainda que a vistas com o melhor vestido do mundo, continua a ser a última a chegar à festa”, atirou Alessandro Bifano sem rodeios.
“Teremos muito que demonstrar e provar, num esforço adicional face às demais concorrentes. É esta a nossa declaração de intenções, mesmo sabendo que com a SRK400 estamos a entrar num segmento muito, mas mesmo muito, competitivo”. O preço não é um negócio da China, o que significaria ser ridiculamente inferior ao da concorrência. “Queremos posicionar-nos da maneira correta de início, mesmo sabendo que há modelos bicilíndricos à venda que deveriam custar bastante mais. E há marcas que vão ter de subir preços”, concluiu.

Doze mil unidades em cinco anos
O objetivo de vendas passa por atingir 10.000 unidades de toda a gama existente e vindoura “nos próximos cinco anos em Espanha”. Meta apresentada por Alessandro Bifano que reforçou a ideia com os “cinco por cento de quota de mercado”. Em Portugal esse valor traduz-se em “pouco mais de 2.000 unidades, ou seja cerca de 2% do volume de mercado expectável”, confirmou Paulo Anjos.
“Acredito que as ‘naked’ de 700cc / 800cc vão ser os modelos mais representativos da QJMOTOR, no segmento que mais vende. Mas também onde estão todos os ‘pesos pesados’ da concorrência”, confessou Carlos Lopez. “Há muita gente a converter-se às trail de média cilindrada, situadas entre as quinhentos e mais de 1000cc. Por isso sentimos que estamos bem posicionados com os modelos que já temos e iremos apresentar nos próximos tempos. É verdade que temos expetativas por modelos, mas queremos pensar mais em termos globais. Até porque esta é uma marca que é nova e se apresenta ao mercado nessa condição”.
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