As confissões de Jonathan Rea

Outubro 1, 2021

JR1 edited - MotoX
As confissões de Jonathan Rea 12
  • Texto: Fernando Pedrinho
  • Fotos: Eva Blanquez, WorldSBK, Fernando Pedrinho

Com o Mundial de Superbike ao rubro, está à vista de todos que o futuro campeão mundial da presente época sairá do vencedor da contenda entre Jonathan Rea e Toprak Razgatlioglu. Todos estão também cientes que o fim-de-semana no AIA poderá ser decisivo, numa pista onde o norte-irlandês joga ‘literalmente’ em casa e poderá retornar o pêndulo da pontuação a seu favor. Estivemos com Jonathan num lindo final de tarde na montanha russa de Portimão para escutar as suas confissões.

MotoX: Jerez de la Frontera já deitaste para trás das costas, presumo…

Jonathan Rea: Sim, sim e estou contente por muitas razões. Foi um fim-de-semana complicado, dentro e fora da pista. Por isso estou contente por estar aqui [no AIA], para virar a página e andar para a frente.

MotoX: Numa pista que é possivelmente uma das tuas favoritas.

JR: Sim, tal como Phillip Island. Portimão é como uma pista de motocrosse, muito técnica.

JR 2 - MotoX
As confissões de Jonathan Rea 13

MotoX: Que campeonato estamos a assistir este ano. O pêndulo da liderança tem mudado de prova para prova e ninguém sabe o que vai acontecer. Não recordo um campeonato tão equilibrado em que tenhas participado.

JR: Exatamente! No início da temporada estive muito forte mas a meio da mesma algumas corridas foram desastrosas. Agora, nesta parte final, a má sorte tem batido à porta do Toprak e da minha. Ao fim de dez rondas, o campeonato está muito renhido e a diferença é de 20 pontos, o que é bom para toda a gente, muito estimulante para mim e que melhor sítio para iniciar mais um fim de semana do que Portimão, que costuma ser uma pista muito boa para mim.

JR 3 - MotoX
As confissões de Jonathan Rea 14

Toprak, o adversário mais completo

MotoX: O que achas que tem tornado esta época tão competitiva?

JR: O Toprak já entendeu melhor a sua consistência. No passado ele era super-rápido nalgumas corridas, mas menos consistente. Agora parece estar a trabalhar muito melhor com a sua equipa, está a pilotar muito bem e demonstra muita confiança. E isso é a principal razão para estarmos tão próximos. No passado eu sempre fui consistente e os outros pilotos eram rápidos, mas não sabiam como perder. Atualmente, o Toprak já entendeu que há dias em que tem de terminar em segundo ou terceiro. Lembra-te quando o Álvaro [Bautista] podia ganhar com 15 segundos de vantagem e no fim de semana seguinte acabava no chão. O mesmo acontecia com o Chaz Davies e o Tom Sykes. Eles podiam bater-me num fim-de-semana, embora não fosse fácil, mas na ronda seguinte era um desastre para eles.

MotoX: O Toprak é o adversário mais duro que já defrontaste?

JR: Em termos de consistência, sim! Sob o ponto de vista da performance e velocidade é muito difícil negar que foi o Álvaro, no início da época de 2019, porque ele ganhou corridas com margens avassaladoras e de uma forma muito fácil. O Toprak tem ganho corridas, mas também tem dado 100% do que é capaz. Diria que ele é o rival mais completo que já defrontei.

JR 4 edited - MotoX
As confissões de Jonathan Rea 15

Privado de 500 rpm

MotoX: A tua época começou muito bem. Nova aerodinâmica na moto e resultados excecionais nos treinos de pré-temporada, onde foste o mais rápido. Na primeira corrida viste-te privado de 500 rotações no regime máximo da tua ZX-10RR Ninja. O que representou esta alteração inesperada?

JR: Nós temos a moto que faz menos rotação de toda a grelha. O que isso fez foi que, para atingirmos a velocidade máxima em reta, temos de ter a moto com relações de transmissão muito longas. Isso faz-nos perder em aceleração, o que constitui o principal problema. Noutros circuitos obriga-nos a passar mais vezes de caixa, porque nalguns pontos ficamos ‘curtos’ de rotação e temos de passar à mudança acima antes da curva seguinte. Em Jerez, por exemplo, conseguimos manter a mudança utilizando a configuração que tínhamos nos testes de pré-temporada.

MotoX: Isso era bem visível em Navarra, com a última curva negociada em primeira velocidade a que se seguia a longa reta.

JR: Exato! Perdemos muito na aceleração mas… as regras são estas. O meu maior problema foi sabermos disto [que as 500 rpm solicitadas para homologação não haviam sido aceites pela comissão técnica da FIM, alegando esta que o motor não era ‘novo’ a ponto de permitir essa alteração] dez dias antes da primeira corrida. A comunicação entre a FIM e a Kawasaki foi muito má.

MotoX: A história desta época podia ser agora diferente se tivesses essas 500 rotações extra?

JR: Não acredito que se tratasse de uma história diferente, mas seguramente seria muito mais competitivo.

JR 5 - MotoX
As confissões de Jonathan Rea 16

Pirelli nivelou a vantagem

MotoX: Considero que algo que veio interferir com a tua proverbial consistência foram os novos pneus desenvolvidos pela Pirelli. Normalmente, conseguias andar sempre com um pneu traseiro mais duro que os teus adversários, que não conseguiam ter a tração que consegues sacar da tua Ninja, mas fiquei espantado quando revelaste que desde os testes da Catalunha que a equipa tem vindo a tirar aderência na roda de trás porque colocam em crise o pneu dianteiro.

JR: O equilíbrio da moto ficou muito comprometido desde que a Pirelli disponibilizou o novo [SCX 0]557 traseiro. Ficou muito difícil parar a moto porque este pneu novo tem muita aderência e coloca um esforço adicional na frente. Eu piloto a moto utilizando muito a roda traseira, mas o que sucede é que agora o novo pneu está sempre a empurrar a frente. Devido ao caráter do motor da nossa moto, que é bastante comprida, a falta de um extra de rotações que ajudasse a parar a moto veio tornar a travagem mais complicada. Eu estou a levar a frente ao limite em todas as curvas e nalguns circuitos temos mesmo de utilizar o 557 traseiro, sem alternativa, porque a temperatura do asfalto é tão alta que é o único que oferece uma aderência superior e de forma consistente ao longo de toda a corrida. Claramente não temos o equilíbrio perfeito na ZX-10RR mas estamos a trabalhar nisso, até porque acho que o 557 vai tornar-se na escolha generalizada de toda a grelha, como acontece ainda com o SC X. Temos de aprender a geri-lo nos testes de pré-temporada.

MotoX: Mas concordas que os novos Pirelli de desenvolvimento, sobretudo os traseiros, vieram resolver os problemas de tração de que equipas como a BMW e a Honda tanto se têm vindo a queixar, face à proverbial capacidade de tração das Kawasaki oficiais? Isto não veio também ajudar a nivelar um pouco o jogo?

JR: Sim, mas tu também não podes ter tudo! Em certas alturas os pneus vão adequar-se mais às motos de um dado construtor, embora seja verdade que perdemos a nossa vantagem competitiva. Com o Pirelli mais duro eu consigo ser mais rápido que todos os outros. Na verdade, a razão porque ganhámos corridas no início da época não foi por os meus adversários terem escolhido o pneu traseiro mais macio, mas antes porque eles eram mais lentos com o duro.

JR 6 edited - MotoX
As confissões de Jonathan Rea 17

MotoX: Como no Estoril?

JR: Exatamente! Mas talvez estejamos a exigir demasiado do pneu dianteiro. Por isso temos estado a tirar alguma aderência da traseira, como em Jerez de la Frontera, através de algumas alterações da geometria. Nos testes de inverno que virão pela frente teremos de descobrir a melhor forma de aproveitar a aderência extra que te dá este 557. Talvez tenha de modificar um pouco o meu estilo de pilotagem, mas no cômputo geral a situação não é assim tão grave. É certo que sofri consideravelmente em Barcelona e na segunda corrida de Jerez, mas não estamos a milhas de distância dos melhores: são apenas algumas décimas de segundo por volta.

ZX-10RR Ninja precisa de mais motor!

MotoX: Como colocas a tua Kawasaki ZX-10RR Ninja face às suas oponentes?

JR: Não posso apontar muitos pontos negativos nela, mas claramente necessitamos dar um passo em frente. Apresentámos uma moto nova este ano, mas na realidade não progredimos como esperávamos. A moto parece ser muito diferente, por causa das alterações na aerodinâmica, mas o motor é praticamente o mesmo do ano passado em termos de prestações, com o mesmo regime máximo. Esperava mais, tal como toda a equipa.

MotoX: Mas o que esperavas mais, exatamente?

JR:Ter mais motor! A minha moto é lenta em velocidade, quando não medida no ponto de travagem. Até o Alex [Lowes] que é uns quilos mais leve do que eu é lento em velocidade pura. Depois, as Kawasaki das equipas privadas estão no fundo da classificação, como as da Pedercini e da Pucetti. É verdade que a nossa moto é muito forte nalgumas áreas, mas o ponto forte que temos de trabalhar é este. Até na travagem, onde somos tradicionalmente fortes, temos vindo a sentir dificuldades crescentes. Por isso, não sei como comparar a nossa moto com as outras, mas temos de melhorar decididamente. Não creio que a nossa moto seja a referência do campeonato.

JR 7 edited - MotoX
As confissões de Jonathan Rea 18

A ‘fuga’ de Toprak e os recrutamentos na MotoGP

MotoX: Como foi possível a Kawasaki e a Provec deixarem ‘escapar’ o Toprak para Yamaha, quando todos o antecipavam como teu companheiro de equipa e sucessor?

JR: (pausa) Hmmmm. Olha para o seu gestor de carreira! (pausa) Digamos que o Toprak não toma muitas decisões. É sempre o [Kenan] Sofuoglu. Vejo muitas entrevistas dele em que diz: eu decidi isto, eu decidi aquilo! (pausa) Não faz muito o meu estilo… e mais não digo.

JR 8 edited - MotoX
As confissões de Jonathan Rea 19

MotoX: A Honda está em vias de trazer pilotos da MotoGP [alegadamente, Iker Lecuona e Xavi Vierge]. O Álvaro Bautista regressa à Ducati. Os italianos têm novos pilotos a prometerem muito como Andrea Locatelli e Alex Bassani. Por sua vez os britânicos estão de saída, como o Chaz Davies, e não se sabe o que sucederá com a continuidade do Leon Haslam ou do Tom Sykes. Numa fórmula que tem sido dominada pelos britânicos anos a fio, achas que poderemos assistir a uma ‘latinização’ em termos de principais protagonistas num futuro próximo?

JR: Hmmm… espero que não! A Superbike é muito importante para o Reino Unido. O campeonato britânico [BSB] é um dos melhores, com muitos pilotos rápidos e alguns deles bastante jovens. É um campeonato com tanto prestígio e que paga bem, que é mais fácil permanecer nele e ser-se uma super estrela, do que arriscar vir para o Mundial. Com a saída do Tom [Sykes], do Chaz e talvez do Leon, ficarão menos britânicos como eu, o Alex ou o Scott [Redding] a defender as cores do Reino Unido. Temos de fazer algo para trazer os novos talentos para o campeonato com boas motos. Contudo, a vinda destes pilotos da MotoGP e suas categorias é bom para o Mundial de Superbike. O Lecuona ou o Vierge podem não ter o estrelato do Nicky Hayden, Max Biaggi ou do Carlos Checa, mas são talentosos e é bom que venham e mostrem do que são capazes.

JR 9 - MotoX
As confissões de Jonathan Rea 20

Passagem ao lado da MotoGP

MotoX: Uma das questões que mais me colocam é porque razão nunca deste o passo para a MotoGP. Afinal de contas é um seis vezes campeão mundial de Superbike…

JR: Honestamente, nunca tive essa oportunidade. Falei com algumas equipas, no passado, mas não passou disso. Nunca recebi uma proposta para ir para MotoGP! Tentei arduamente, como o meu gestor de carreira, dar esse passo mas não resultou.

MotoX: E porque achas que isso aconteceu dessa forma?

JR: De novo com muita honestidade: nem com as equipas de m*** do fundo da tabela surgiu essa oportunidade. É esta a história da minha vida, com a carreira feita no Mundial de Superbike, onde estou muito feliz, diga-se de passagem. Não me arrependo mas confesso estar algo triste por nunca ter tido essa oportunidade.

JR 10 - MotoX
As confissões de Jonathan Rea 21

Vencer é com uma droga!

MotoX: Seis títulos no currículo e um sétimo em aberto. O que é que te faz levantar diariamente para correr?

JR: Apenas o sentimento de ganhar! Tenho fome de vitória. Já faz algum tempo que não ganho uma das corridas longas, tirando a ‘superpole race’ de Barcelona [e a de Magny Cours, na secretaria]. Sinto falta desse ‘feeling’, é como uma droga. O inverno passado foi o que trabalhei mais arduamente em toda minha vida a minha condição física, para estar preparado e mais forte mentalmente. São tempos entusiasmantes e quero ver o que vai dar o resto da temporada. Depois necessito descansar por algum tempo e focar-me novamente para 2022. Sei que não tenho muitas mais épocas pela frente, por isso vou tentar ser o mais competitivo que possa, pelo tempo que for possível.

MotoX: O que esperas e tens na lista de desejos para 2022?

JR: Antecipo que o Toprak e a Yamaha voltem a ser muito fortes e que o Bautista seja muito competitivo no regresso à Ducati. E espero dar um passo em frente. Sei que isso é muito difícil de alcançar com a minha moto à luz dos regulamentos atuais, mas temos de ‘dar o litro’ em todas as áreas de forma a que possa lutar em cada fim de semana pelo primeiro lugar, que me permita cometer menos erros e bater-me pelo campeonato.

TRK 502 edited - MotoX
As confissões de Jonathan Rea 22

De Benelli TRK 502 em Portimão

Viajámos até Portimão numa Benelli TRK 502, equipada com o conjunto de malas Shad Terra, que nos permitiu trazer muita bagagem desde Vila Nova de Gaia até à solarenga província algarvia. Obrigado ao Hugo Santos e à Multimoto por aceitarem o desafio!

Com um cruzeiro interessante e boa ergonomia, a TRK 502 tem ainda pela frente outra missão que mais tarde vos darei conta. Para já, são cem quilómetros diários entre Montechoro e a pista da Mexilhoeira Grande que temos diariamente pela A22. Com um consumo médio de 5,5 l/km, a autonomia atinge confortavelmente os 250 quilómetros com um depósito, mas já conseguimos superar a marca dos 300, com a italiana fabricada na China, a concitar olhares de curiosidade por onde passa e justificam o sucesso de vendas que tem alcançado em Portugal.

Partilha este artigo!

Moto Guzzi V100
Moto Guzzi V85TT
Aprilia Tuareg 650
Aprilia Tuareg 650
Moto Guzzi V100
Moto Guzzi V85TT
Moto Guzzi V85TT
Moto Guzzi V100
Aprilia Tuareg 650
Pesquisa

Não encontrado