Mondial Piega 452. O prazer do excesso

A Mondial Piega 452 é uma das provas evidentes de que a marca italiana está a viver, provavelmente, a mais decisiva etapa do seu terceiro momento histórico. A aposta em segmentos de mercado específicos com uma definição estética arrojada, reforçada pela sua atitude dinâmica, garante que ninguém lhe ficará indiferente!

Mondial Piega 452
  • Texto: Alberto Pires
  • Fotos: Paulo Ribeiro, arquivo Mondial

A Mondial nasceu em 1948, em Milão, pelas mãos do Conde Giuseppe Boselli, um amante das duas rodas e ex-piloto. Detinha uma fábrica de triciclos para transporte de mercadorias e, como achava que a competição era a melhor forma de promover os seus produtos, criou uma 125 a quatro tempos. Que nesse mesmo ano venceu em Monza com Nello Pagani aos comandos, tendo estabelecido igualmente recordes de velocidade no quilómetro e na milha.

Mondial Piega 452

No ano seguinte, em 1949, foi criado o Campeonato do Mundo de Velocidade, e Nello Pagani sagrou-se campeão do mundo na classe de 125. O domínio da marca no mundial de velocidade continuaria, arrecadando o título nos dois anos seguintes. A sua presença no Campeonato do Mundo manteve-se até 1957, altura em que grande parte das marcas italianas o abandonaram por se ter tornado demasiado dispendioso.

O agradecimento da Honda

Ficou para a história também a ajuda prestada à Honda no desenvolvimento das suas motos de competição. Soichiro Honda pediu ao Conde Boselli que lhe vendesse uma moto de competição, e este decidiu oferecer-lhe uma das suas motos. Soichiro Honda nunca se esqueceu deste gesto de desportivismo e cortesia, tendo-o manifestado publicamente por diversas vezes.

A marca reapareceu mais tarde, entre 2003 e 2004, com a Piega 1000, uma bicilíndrica desportiva que montava, como compreendem agora a razão, o motor da Honda SP-01.

A atual terceira fase da sua vida começou em 2015, com a apresentação da HPS 125 no salão de Milão. Nove anos depois, com esta Mondial Piega 452, inaugura de alguma forma uma nova abordagem no segmento Naked. Pegando nas palavras da casa transalpina: Bem vindos à pura essência da condução!

A materialização desta sensação resulta, naturalmente, de um conjunto de elementos.

O mais puro estilo italiano

Estéticamente é um assombro, sendo a versão cinza com apontamentos a laranja e preto a que melhor valoriza as linhas assinadas por Rodolfo Frascoli. São inúmeros os detalhes, combinando a agressividade que se pretende para o comportamento dinâmico desta Piega, com o traço de bom gosto, tão difícil de exprimir quanto evidente de se sentir num olhar demorado. E vale a pena passear pelos seus detalhes.

Mondial Piega 452

As formas recortadas dos painéis e banco, o braço oscilante, os faróis, o duplo escape e as jantes formam um conjunto distinto e bem estruturado. Já a cobertura da roda traseira transporta-nos para o universo da performance aerodinâmica do MotoGP, assim como as pequenas asas dianteiras na parte superior da carenagem, como se alguma vez disso houvesse necessidade ou tivesse merecido o respetivo estudo. Mas ficam bem, estão bem desenhadas e fazem a diferença num segmento que vive da ebulição do espírito.

Ciclisticamente, apoia-se num novo quadro treliça em aço, com monobraço em alumínio. A suspensão dianteira é invertida, com 41 mm de diâmetro e 120 mm de curso, sem qualquer tipo de afinação, tal como o monoamortecedor traseiro. A travagem dianteira está entregue a um disco flutuante de 320 mm, com pinça e bomba radiais, e na traseira um disco de 240 mm com pinça simples.

Motor desportivo

As caraterísticas do motor complementam este quadro. Os números declarados para o seu bicilíndrico de 449, 5 cc, de 47 cv às 9.500 rpm e com um binário máximo de 39 Nm às 7.600, estão em linha com a referência desportiva para a carta A2, e o que se espera para a vocação desta Piega.

Mondial Piega 425

O design é bravo mas as suas características e dimensões não sugerem um comportamento radical. A distância ao solo é de 820 mm e o peso de 177 kg em ordem de marcha, favorecido pelo depósito de apenas dez litros, também não apontam nesse sentido, mas assim que nos sentamos percebemos que é diferente. A razão está na combinação da posição do corpo, colocado sobre a frente, sentindo-se a roda dianteira de uma forma muito mais presente que o normal neste segmento. Ou seja, é uma Naked que não resulta do despir dos elementos, havendo aqui uma manifesta intenção de a viver com intencionalidade.

Mondial Piega 425

O primeiro contacto não engana e a sensação atrevida da posição de condução é potenciada assim que se coloca o motor a trabalhar. A intensidade e profundidade do som que emite não tem paralelo, e custa até a acreditar como passou na homologação. Num primeiro momento até temos um cuidado acrescido para não darmos tanto nas vistas, mas assim que trocamos o chip mental não demora muito a procurarmos uma zona mais espaçosa e sem semáforos para ver até onde vai. O resultado é agradável e distinto, sente-se que tem pouca inércia e sobe de rotação com facilidade nas três primeiras velocidades, mas depressa percebemos que a trela é curta e a travagem está demasiado progressiva.

Eletrónica sempre presente

O mapa Standard é demasiado conservador e, como integra o controlo de tração com o ABS, nem deixa fazer habilidades na aceleração ou na travagem. Ou seja, nem levantamos a roda da frente nem a afundamos ou fazemos abanar a traseira. Neste caso é até delicado em termos de segurança pois, numa travagem de emergência, a distância de travagem na dianteira é demasiado prolongada. Ou seja, julgo que o mapa desportivo é melhor em tudo. Tanto na alegria que proporciona em aceleração como na performance da travagem, tornando-se o Standard apenas útil em piso molhado.

O comportamento ciclístico está de acordo com a vocação malabarista. Ou seja, quando se maximiza a agilidade paga-se em estabilidade nas curvas rápidas, para além do corpo nesta moto estar numa posição mais saliente. Não há aqui um risco acrescido, mas temos de nos habituar a sentir mais o eixo dianteiro nas mãos que os pés nos patins, mais a roda dianteira que a traseira. Acresce que o banco é firme, tal como o acerto das suspensões. Depois de interiorizarmos essa nova dinâmica, podemos ir ao encontro do que os Pirelli Angel GT oferecem, revelando-se adequados ao espírito desta Piega.

Velocidade de Grande Prémio

A característica que mais me impressionou na Mondial Piega 452 foi contudo a capacidade de alongamento do motor. A relação de transmissão é bastante longa, sobretudo para uma moto sem carenagens, e sabe bem levar a escala do taquímetro até aos cinco dígitos. A velocidade máxima em estrada plana, sem termos que nos esconder dentro do depósito de combustível, é atingida em 5ª velocidade. E note-se que já está acima dos 210 km/h no velocímetro, registo que pode ser melhorado em 6ª velocidade se a descida for longa. A melhor parte é contudo a contribuição proveniente do escape, cuja sonoridade passa do registo inicial grave para agudo. Som que faz parecer rodar a bastante mais do que as 12.000 rpm evidenciadas a vermelho no painel.

Mondial Piega 425

Alguns detalhes podiam ser melhorados. A distância mínima para a manete dianteira torna-a ainda assim demasiado afastada, o que limita a força a exercer. Já gora, também a da embraiagem poderia estar mais próxima. Para facilitar a vida podemos deixar alguma folga no cabo de acionamento, mas já estamos a entrar nas opções de recurso. A caixa de velocidades, de forma mais acentuada nas três primeiras relações, é demasiado dura. Ao ponto de tornar-se desconfortável quando rodamos devagar, obrigando sempre a acionar a embraiagem. Quanto ao painel, não comprometia a pureza e agressividade da dianteira se fosse um bocadinho maior.

Mondial Piega 452

Mondial Piega 452

Mondial Piega 452

Mondial Piega 452

Mondial Piega 452

Espírito irreverente

Pode-se considerar esta Mondial Piega 452, apesar de limitada pela cilindrada como uma Hypernaked. Ou seja, incentiva a vários níveis muito mais do que aquilo a que o seu motor, em princípio, assegura. A sua faixa de utilização torna-se assim mais estreita. Não gosta de andar calmamente em cidade, tanto pela dureza das suspensões como pelo acionamento da caixa. Não vai ser um sucesso nas passeatas em estrada com os amigos porque, pelo conforto de banco traseiro dificilmente repetirá a companhia. E assim que as curvas se tornarem interessantes vai deixá-la para trás. Em autoestrada, apesar do alongamento proporcionado pela sexta velocidade, ao fim de cinquenta quilómetros já nos faz sentir dores no pescoço próprias de um treino de râguebi. Para além de ficar a conhecer mais algumas estações de serviço que os restantes.

Mondial Piega 425

Ou seja, esta Mondial Piega 452 é um estado de espírito, cuja escolha não resulta de uma análise racional. É mesmo para quem gosta do que vê, do que imagina que vai poder fazer, e em que tudo se aceita porque é mesmo assim. E ainda bem!

O preço, a partir de 6.399 €, está perfeitamente de acordo com as especificações e a exclusividade que oferece. E, garanto, é mais impactante ao vivo do quem em fotografia. Consulte a lista de concessionários e verifique !

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