Yamaha Tracer7. A síndrome do irmão do meio.

Autor:  Paulo Ribeiro

Julho 11, 2021

A nova Tracer7 é a mais recente proposta da Yamaha no segmento Sport Touring de média cilindrada

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  • Texto: Paulo Ribeiro
  • Fotos: Delfina Brochado

Existe, na psicologia, um efeito familiar comummente apelidado de síndrome do filho do meio, aplicado como forma de explicar um feitio próprio, específico, do irmão que nasceu depois do mais velho, o especial, aquele de quem tudo se espera, e o mais novo, mais mimado e a quem tudo se permite. A literatura sobre o tema é extensa e… inconclusiva.

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Herdar roupas ou brinquedo do mais velho é algo que nem sempre é bem visto pelas crianças – “só ele é que tem coisas novas!” – como o carinho dedicado ao novo bebé pode, também, ser motivo de ciúmes. Ou seja, o do meio pode não ser tão pressionado a fazer tudo bem, a ser um aluno exemplar e um prodígio de comportamento social, mas também não tem a superproteção do caçula.

As vantagens de saber desenrascar-se

No entanto, ser o filho do meio, tem inúmeras vantagens. A começar por uma maior independência e tirar partido das experiências, das portas abertas pelo mais velho. E ter até, imagine-se, direito a um dia só deles, comemorado a 12 de agosto! Sim, é verdade, é o Dia do Filho do Meio.

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Mas existem outras características que advêm da posição cronológica ocupada no seio da família. Tem, também, uma maior capacidade de adaptação porque, facilmente, se apercebe que não tem toda a atenção para si como teve o primogénito e tão pouco a permissividade dada ao mais novo.

Aprende, pois, a desenrascar-se. A conseguir fazer tudo bem, mesmo se, por vezes, os outros podem ofuscar-lhe o brilho. Mas a verdade é que é, regra geral, o mais discreto e poupado, mas também o mais equilibrado e, a médio/longo prazo, o mais apreciado, acabando por fazer valer, serenamente, as suas características. E não, não estou apenas a falar de mim, orgulhosamente filho do meio, mas também, imagine-se, da nova Yamaha Tracer7, a mais recente e profunda transformação da Tracer 700 apresentada ao mundo em 2016.

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A verdade é que, quando nasceu no seio de uma família Yamaha em franco crescimento, a Tracer foi brindada, logo no momento da conceção, com o conhecido motor CP2 da MT-07, lançada em 2014, a tal irmã mais velha. Ou primogénita, para ser mais simpático. Foi uma boa herança, sem qualquer sombra de dúvida, porque ganhava, de uma assentada, um bom coração, com grande vivacidade, saudável em repouso, sem arritmias antes com um bater certinho inclusive a baixas rotações, mas capaz de suportar os mais rudes esforços exigidos a uma desportista.

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Mesmo sem pensar em medalhas olímpicas, a Tracer 700 mostrou, desde os primeiros passos, uma força interior capaz de ultrapassar todas as situações, de rodar tranquilamente, em modo turístico, apreciando a paisagem, ou abordando a cidade sem sofrer o stress racing da mais nova para logo ter autoridade para umas escapadas mais ariscas. Tinha a porta aberta para as mais divertidas viagens, em estradas encaracoladas onde não enjeitava uma boa picardia com outras irmãs do meio, como a Suzuki V-Strom 650 ou a Kawasaki Versys 650.

Correr pelo direito à diferença

Era diferente e tinha a perfeita consciência disso. O bicilindro paralelo CP2, com cambota de planos cruzados e ignição desfasada a 270º dava-lhe uma alma diferente. Um pulsar único e uma prontidão perante qualquer desafio que a fazia brilhar nos momentos mais inesperados, com acelerações decididas desde os regimes mais baixos. Uma elasticidade que permitia arrancar como verdadeiro sprinter e rodar em ritmo de maratonista, quilómetros a fio.

Até porque, como nunca foi de beber muito, aguentava as mais longas tiradas sem perder muito tempo em paragens nas incaracterísticas áreas de serviço. Era preferível aproveitar todo o tempo para brincar, saltitando de curva em curva ou parando onde a paisagem, deslumbrante, pedia uma foto para o álbum das boas recordações. E aí, senhores e senhoras, que eficiência e classe, que firmeza e agilidade. Até porque o abaixar do centro de gravidade, ainda que mínimo, reforçou a maneabilidade. O que a deixa ainda mais à vontade nas serras como na cidade.

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Sem birras à chegada do bebé Ténéré

O trauma de ser a segunda da linhagem não a abatia porque sabia que podia ir onde a irmã MT-07 estava proibida. Viagens mais longas e até um pouco de aventura em caminhos para lá das estradas asfaltadas eram não só possíveis como desejáveis. Ao corpinho esguio e atlético, tal como a irmã, juntava uma maior altura, apropriada para outros desafios. Carregava melhor com as malas, defendia-se melhor do vento e da chuva (e podia evoluir facilmente com um ecrã opcional, de maiores dimensões), cansava-se menos quando a estrada era longa. E quando o piso piorava defendia-se melhor que a primogénita, graças às pernas mais longas, com suspensão de maior curso, oferecedoras de uma surpreendente capacidade de bailar mesmo nos mais exigentes palcos como nas Dolomitas.

Nesse maciço montanhoso no nordeste de Itália, integrado nos Alpes, conhecemos a primeira das Tracer ao longo de um dia intenso, com intermináveis subidas e descidas, cada uma com dezenas de curvas rumos a portos de montanha, passagens em altitudes superiores a 2000 metros, palco de exigente teste que, diga-se desde já, foi superado com distinção pela pequena Tracer. Nomes míticos como Pordoi, Falzarego, Valparola, Gardena, Sella, ou Giau, bem conhecidos das grandes voltas ciclísticas e de motociclistas de toda a Europa, ajudaram a comprovar as boas acelerações e forte sensação de binário, proporcionadas pelo motor.

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Era a prova do acerto na dosagem dos mais importantes ingredientes de um cocktail de eleição, onde motor e ciclística casavam de forma harmoniosa. Onde as acelerações suaves mas decididas marcavam o ritmo e um quadro de desenho simples mas enorme eficácia, permitia máxima diversão sem exigir dotes de um qualquer candidato a substituto de Valentino Rossi…

O nascimento da irmã mais nova

Tudo corria na perfeição para a pequena Yamaha Tracer 700, com vendas condizentes com o bom feitio da catraia, até que, os pais, pressionados por outras famílias e muitos amigos, anunciaram ao Mundo o nascimento da T7, Ténéré de nome próprio, revelando traços de ADN que vinham das ancestrais ganhadoras do Rali Dakar. Aventureiras que tinham, agora, uma sucessora digna, de uma elegância digna de desfilar em qualquer deserto como nos mais exigentes trilhos dos desafios off-road lusitanos.

Foi um choque para a Tracer. De repente o mundo fugia-lhe debaixo dos pés. Parece que mais ninguém reparava nela. Todos tinham olhos para a recém-nascida. Era linda, tinha um corpinho de bradar aos céus e fazia umas habilidades de que ela nunca seria capaz. Não se podia atrever a ir até onde a Ténéré brincava mesmo se, por algum tempo, enquanto os sapatos deixavam, lá a seguia à distância. Mais do que nunca ficava claro que subidas íngremes em terra solta, calhaus, areia ou lama estavam longe de ser a sua praia.

A teimosia de um carácter bem vincado

Mas, como filha do meio, a Tracer não se deixou abater e logo pensou na forma de voltar à ribalta. O Euro5 ditava leis impossíveis de contornar mas as obrigatórias mudanças na eletrónica, admissão e escape não mudaram o espírito multifacetado, antes reforçaram a capacidade de adaptação a todas as situações, com mais facilidade de ultrapassar obstáculos, com mais força em todos os ritmos. Mostrava-se, agora, mais decidida, mais madura, de resposta sempre na ponta da língua. Bastava torcer um pouco o punho direito que logo ela respondia, de forma decidida, vigorosa, mas sem brutalidade. Toda ela facilidade e eficácia.

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Os dados do bilhete de identidade (cilindrada: 689 cc, potência 73,4 cv/8750 rpm, e binário 68 Nm/6500 rpm) ficaram praticamente inalterados, mas as mudanças de caráter, essas são visíveis. Inegáveis desde o primeiro momento, fruto de uma profunda reflexão do que seria a sua vida, agora que a mais nova das irmãs ameaçava fazer-lhe sombra.

Renascer para honrar a família

Reagiu bem ao aparecimento da Ténéré 700 a rejuvenescida Tracer7. O 700 ficou para a história porque quem muda assim de cara também pode usar um novo nome. Assumiu a veia mais estradista e deixou para a irmã a exploração de outros caminhos, deixando claro, porém, que desde que os sapatos permitam, também pode ir longe nestas ousadias de sujar a roupa. Sim, porque os Michelin Pilot Road 4 são excelentes em todos os pisos… desde que sejam bem asfaltados.

E também se demarcou da outra irmã, a primogénita MT-07 (e já agora da ‘meia-irmã’ XSR 700…), cada vez mais aguerrida, capaz das maiores diatribes sem que ninguém ousasse colocar-se travão. Também de travões estava ela bem servida e assim ficou para 2021… Dois discos de 282 mm à frente, com pinças de 4 pistões, (245 mm e 2 pistões atrás) são garantia de grande potência, mas, acima de tudo, oferecem uma dose excelente de controlo e precisão. Para quem gosta e sabe.

Quando se aperta com ela, a resposta surge com a “altivez de um milhafre ferido na asa”. Afinal, e continuando a tirar partido dos belos versos de Carlos Tê bem cantarolados por Rui Veloso, no tema Lado Lunar, “toda a alma tem uma face negra”. O que, se quisermos enveredar por analogias universais, sem fugir à tentação conquistadora dos nossos antepassados que, de caravela, chegaram até ao Oriente, podemos associar ao Dark Side of Japan que serve de mote à orientação MT, a tal da outra irmã….

Ida ao salão de beleza

Foi à esteticista e tratou de sublinhar traços de uma beleza que o tempo ia diluindo. Mostrou fotografias de algumas primas, sobretudo da grande brasa que é a Yamaha R1, e pediu mudanças no visual. E ficou mais bonita, com traços mais arredondados e elegantes, menos vincados e agressivos, mas capazes de fazer voltar mais cabeças à sua passagem. Então de vestidinho vermelho…

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Aproveitou e deu uma saltada ao ginásio. As pernas (leia-se suspensão dianteira) mostravam sinais de alguma flacidez quando o ritmo em estrada aumentava, com vantagens que só se percebiam depois, quando o bom asfalto dava lugar ao empedrado ou até mesmo à terra batida de uns caminhos a que ela nunca se escusara. Por fora ficou tudo igual, com 41 mm de diâmetro e 130 mm de curso na dianteira e 142 mm atrás, mas, por dentro, os músculos foram bem trabalhados e ficou mais rija. E assim ganhou capacidade para aguentar outros ritmos, deixando de lado o bambolear que muitos criticavam no exigente e delicado ballet ou nas sensuais mornas, para poder, agora, brilhar no mais rebuscado dos tangos ou no mais físico dos sapateados. E sem destoar ou ficar envergonhada numa dança stiletto

Uma pausa para ir ao Google…

Agora que já perguntaram ao tio Google que dança é essa, talvez seja mais fácil explicar que as mudanças no interior do sistema de amortecimento revelaram um comportamento mais rígido, é certo, mais estradista se quiserem. A verdade é que, com um mínimo de paciência e uma chave de fendas (que está na bolsa de ferramentas debaixo do banco tal como a chave específica para ajuste da pré-carga do amortecedor traseiro) é possível afinar a gosto o comportamento em extensão do hidráulico, à medida de cada situação, de cada exigência, gosto pessoal ou estado de espírito.

À frente, com uma chave de luneta ou de bocas pode alterar a pré-carga entre o mais duro (5 mm de altura no topo da forqueta) e o mais suave (20 mm) passando por uma posição de intermédia, favorecendo equilíbrio entre conforto e eficácia (15 mm). Depois, com a chave de fendas, é possível alterar a extensão em 10 cliques consoante se procure maior ou menor suavidade no retorno. Atrás, são sete as posições de pré carga do mono amortecedor e duas voltas e meia no que diz respeito ao ajuste da extensão, entre o mais duro (tudo à direita) e o mais suave (tudo à esquerda)

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Das longas conversas aos banhos de loja

Forma de extrair o melhor de uma moçoila, afoita e despachada, que nos permite esticar um pouco mais as pernas (o banco subiu 5 mm para, ainda assim, bem acessíveis 840 mm) e colocar o tronco mais direito (guiador mais alto 4 mm) para minimizar o cansaço nas maiores tiradas. Longas conversas a dois, permitidas por um depósito de 17 litros e uma média de consumo que, muito facilmente, se atira para baixo dos 5 aos 100. E chegar mesmo aos 4,3 L/100 km que a marca anuncia!

Números que se podem controlar pelo novo painel de instrumentos, umas das joias que ganhou nesta ida às compras, com ecrã LCD agora em negativo, ou seja com o fundo negro e carateres brancos para melhor visibilidade, e com o controlo, fácil e intuitivo, a partir dos botões junto ao punho esquerdo. Resposta a várias críticas surgidas na versão anterior, com os botões no centro do painel, dificultando a procura das informações mais necessárias em cada momento da viagem.

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Uma viagem que só pode ser prazenteira, independentemente do ritmo escolhido e que é gerido apenas pelo punho direito, sem controlos eletrónicos da forma como a potência é entregue ou como a roda traseira é controlada. Apenas o básico e obrigatório ABS (que não pode ser desligado) e um peso de 196 quilos pronta a seguir viagem, que a torna na mais elegante da classe. Afinal, a irmã do meio pode ter (e tem!) muitas virtudes que nem a irreverência da mais velha ou a aventureira ousadia da mais nova conseguem minimizar. E tem até um preço condizente com o seu estatuto: 8795 €, mesmo a meio caminho entre os 7100 € da Yamaha MT-07 e os 10 195 € da Ténéré.

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