Assim que vi ao vivo, pela primeira vez, a Suzuki GSX-8T, lembrei-me de uma frase recorrente no repertório do senso comum. Afinal, crescemos a ouvir dizer que ‘gostos não se discutem’ como um mecanismo de autocensura que nos foi incutido para não ferirmos sensibilidades. Uma forma politicamente correta de acabar com uma discussão ou mesmo para evitar o escalar de debates que ameaçam extravasar as meras questões visuais. Porém, e em face da cada vez maior quantidade de propostas estéticas, digamos que ‘particulares’, o genuíno impulso para elogiar revela-se libertador. É assim, com prazer, que considero a Suzuki GSX-8T um espanto! E quem não gostar… também está no seu direito!

- Texto: Alberto Pires
- Fotos: Rui Jorge/Moteo
O exercício estilístico é sempre um compromisso. E assim foi, naturalmente, na conceção das Suzuki GSX-8T e 8TT! Os estúdios de design trabalham com base num caderno de encargos específico, tanto mais limitado quanto mais definido for o segmento. Todos conseguimos identificar um género à primeira vista, seja trail, desportivo ou turístico. Não é difícil igualmente perceber a geografia de onde provém.

Esmiuçando um pouco mais, conseguimos identificar também imediatamente a que marca pertence determinada moto que nunca víramos anteriormente. Aprofundando a análise, chegamos ao ponto de reconhecer em que modelo é que determinada marca se inspirou, exercício que em alguns casos ultrapassa a inspiração e mais não é do que uma cópia.

Ficará assim demasiado limitada a liberdade criativa? Julgo que não, e é essa a magia da criação. A possibilidade de um conjunto de formas nos surpreender e encantar, sensibilizando-nos e transportando-nos para um universo imaginário de prazer, tão difícil de descrever como evidente no olhar.
A importância do local de nascimento
A Suzuki tem explorado as diferentes nuances dos segmentos de média cilindrada através, precisamente, do design. A plataforma ciclística e motriz criada em 2022 para a trail V-Strom 800 serviu de base, posteriormente, para a GSX-8S, nascendo no ano seguinte a versão 8R. Entre a naked 8S e a desportiva 8R, a diferença resumia-se a detalhes ciclísticos e à definição estilística, mas não deixava de ser evidente o ar de família, já que foram ambas desenvolvidas no gabinete de design da Suzuki no Japão.

Agora, para a Suzuki GSX-8T, a marca apostou numa nova interpretação, pretendendo uma alternativa ao arrojo asiático evidente da naked desportiva 8S. A nova Suzuki GSX-8T deveria ser intemporal, inovadora e apaixonante, de alguma forma revivalista, definível como neo-retro. A concretização destes atributos, que podem parecer incompatíveis, foram entregues ao Centro de Design da Suzuki Itália, em Turim.

O designer francês Arthur Vidal assumiu que, tendo como fonte inspiradora a Suzuki 500 T, procurou recuperar o espírito ‘vintage’ usando apenas elementos que já existissem, redesenhando-os e adaptando-os. Prestando atenção aos esquiços, e contrapondo-os aos que serviram de modelo, o resultado é brilhante. Das três versões cromáticas da Suzuki GSX-8T há uma que sobressai, a Candy Burnt Gold, cuja tradução livre remete para o açúcar caramelizado que costuma cobrir o leite creme. Neste caso é visualmente delicioso!


Herança técnica da Suzuki GSX-8T
Já a versão 8TT é uma declinação pessoal da visão de Arthur Vidal daquilo que poderia ser uma abordagem desportiva. A fonte inspiradora desta vez foi a GS1000S de 1980, modelo que brilhou nas pistas dos EUA com Wes Cooley aos seus comandos.

Ainda no capítulo da definição estética, o farol dianteiro é o elemento que mais sobressai, ou distingue, esta Suzuki GSX-8T. A configuração futurista que caracterizava as 8S e 8R não fazia sentido num espírito que pretende recuperar a memória dos anos 70. No entanto, o formato redondo incorpora a mais recente tecnologia LED, tendo sido objeto de um profundo estudo relativamente à projeção da luz tanto em médios como em máximos. Mantendo-nos na parte dianteira, os espelhos montados nas extremidades do punho vincam o imaginário pretendido e libertam o horizonte visual.
Ciclisticamente não há diferenças entre a Suzuki GSX-8T e GSX-8S, nem havia razões dinâmicas que as justificassem. O quadro em tubo de aço é de grande robustez na zona da coluna de direção e o braço oscilante em alumínio recorre às nervuras do seu desenho para aumentar a sua rigidez. A forquilha Kayaba de 130 mm de curso e 43 mm de diâmetro, sem qualquer tipo de afinação, apenas mudou a cor das jarras para dourado na 8T, mantendo-se pretas na TT. O amortecedor traseiro é também Kayaba, igualmente com 130 mm de curso e com ajuste da pré-carga da mola.
No capítulo da travagem os dois discos flutuantes de 310 mm, assistidos por pinças Nissin de quatro pistões, continuam a ser um valor seguro, tal como o disco 240 mm com pinça de um pistão instalado na traseira. Igualmente a opção para as jantes de dez braços inclinados, desta vez a completarem a opção cromática tanto na Suzuki GSX-8T como na 8TT, valorizando o conjunto.


O bicilíndrico paralelo de 776 cc, com quatro válvulas por cilindro, 83 cv às 8.500 rpm e 78 Nm às 6.800 rpm, já mostrou o que valia em vários segmentos nos últimos 3 anos. A eficácia dos dois eixos de contrabalanço cumprem a missão de diluir as vibrações próprias do desfasamento da ignição a 270º, mas sem apagar o seu carácter. No caso da Suzuki GSX-8T e 8TT, chega acompanhado por um ‘quickshifter’ bidirecional, que pode ser desligado, e que ajuda a tornar as coisas mais imediatas em condução desportiva, se for essa a disposição.
Surpreendente desde o primeiro momento
O primeiro contacto é surpreendente. A versão da Suzuki GSX-8T em Candy Burnt Gold é lindíssima, ofuscando literalmente a 8TT Glass Sparkle Black que estava ao seu lado. Os seus detalhes em cinza são valorizados pelo contraste com o quadro, motor e rodas em negro, fazendo simultaneamente a ligação aos tons dourados da forquilha, mas também do sub-quadro e depósito. Há muito tempo que já não ficava embasbacado com uma moto, e muito menos pertencente a um segmento acessível.

Assim que nos sentamos e lhe tomamos as medidas, a sensação é de algum volume. A largura do depósito de combustível na união com banco é mais larga que na 8S, fazendo com que as pernas fiquem pouco mais abertas e os pés não assentem com a mesma solidez. O guiador está mais próximo dos pousa-pés 25 mm e a sua altura ao solo baixou 20 mm. A altura do banco é superior em 5 mm face à 8S. Sentimos que dominamos com facilidade esta Suzuki GSX-8T, sendo adequada para a utilização relaxada que é suposto proporcionar.
Para esse propósito concorrem a suavidade dos comandos, a leveza da embraiagem e a manete de travão, que permite um ajuste à dimensão de cada mão, regulável em 6 posições. O painel de instrumentos tem uma disposição descomplicada da informação, o tamanho é legível sem necessitar de óculos para ver ao perto e o satélite que controla as suas funcionalidades é fácil de acionar mesmo com luvas.



Uma questão de personalidade
O comportamento em estrada está sempre muito condicionado pela personalidade do motor. Se noutros segmentos a sua linearidade de funcionamento poderia retirar alguma emoção, nesta Suzuki GSX-8T parece um fato feito à medida. Se a marca quisesse um bicilíndrico que fosse capaz de recupera em sexta velocidade desde as 2.500 rpm sem protestar, que 80% do seu binário estivesse disponível desde as 3.500 rpm, debitasse 83 cv e conseguisse alongar até aos cinco dígitos, este cumpriria com todos os requisitos!

O percurso escolhido para este teste cobria todas as valências, sendo excelente para sentir as diferentes facetas entre as Suzuki GSX-8T e 8TT. Iniciei as hostilidades com a 8TT, com a estrada ainda orvalhada. Como configuração inicial, o controlo de tração na posição menos intrusiva e o mapa no motor C, de chuva. Os pneus Dunlop Sportmax Roadsport 2 não deram sinais de desconforto, as suspensões ajudavam a digerir os cambiantes de piso e a suavidade dos travões complementavam este quadro.

Assim que o piso passou a oferecer mais confiança o panorama começou a tornar-se sombrio. O travão dianteiro estava a exigir demasiada pressão, o que descompensava o equilíbrio na condução ao tentar seguir os outros. Esta sensação desagradável só foi desfeita quando troquei e moto e, de imediato, passaram a bastar dois dedos para afundar a frente e colocá-la na trajetória devida. Não se tratava de um defeito ou limitação da moto, apenas poucos quilómetros de rodagem naquela 8TT, especificamente. Não estranhem se porventura andarem numa unidade a estrear.

A segunda surpresa deu-se quando passei da 8TT para a Suzuki GSX-8T. A interpretação desportiva de Arthur Vidal não é muito distinta da versão base, se atentarmos apenas à ficha técnica. A configuração da cobertura do banco da 8TT aumenta apenas em 5 mm a sua altura e as carenagens superior e inferior adicionam apenas 2 quilos ao peso total, o que representa 1%. É, no entanto, suficiente para fazer a diferença, e nota-se!


O banco é mais firme e a carenagem está fixa à suspensão dianteira, sendo percetível na mudança de direção. Ou seja, com o banco mais firme sente-se mais a roda traseira, enquanto na frente a resistência aerodinâmica e o peso adicional tornam a frente ligeiramente mais pesada e lenta nas reações.
Surpresas ao espelho
Mas o entusiasmo com a Suzuki GSX-8T não acabaria aqui. A decisão de fixar os espelhos no topo dos punhos teve como objetivo limpar visualmente o campo de visão, sem deixar de oferecer a necessária imagem do que vem atrás de nós. Essa justificação foi expressa aquando da apresentação estática, mas tornou-se evidente quando a começamos a conduzir. A imagem que é refletida pelos espelhos é também mais adequada pois não aparecem os ombros, apenas uma parte – e pequena – do antebraço.

O painel de instrumentos, um TFT de 5 polegadas, que surge discretamente na parte inferior por detrás do farol, passa também despercebido, sobretudo se estiver com fundo negro. As informações são claras, mesmo no calor dos momentos mais dinâmicos. E é precisamente quando nos decidimos por uma toada mais agressiva que se destacam os diferentes mapas de motor e a intervenção do controlo de tração.
O mais evidente é, sem dúvida, o que faz a gestão da disponibilidade do motor da Suzuki GSX-8T. No modo C, de Confort mas que também poderia designar-se como ‘calmo’, apesar de não reduzir o valor de potência máxima faz com que a aceleração seja bastante mais suave, o que aliado ao binário plano disponível desde as 3.500 rpm torna tudo demasiado sóbrio. Se mudarmos para o modo A, Ativo que também pode ser apelidado de ‘agressivo’, a mudança sente-se bem e transforma de forma absoluta o que se pode sentir numa estrada exigente. Claro que temos de o conjugar com o controlo de tração.
No nível 3, o mais interventivo, não se sente a entrada em funcionamento, é certo, mas também não se sente a mesma aceleração, sobretudo se o piso não estiver muito regular. Já na posição 1, quando conjugado com o modo de motor A, as coisas tornam-se sérias, e a forma como corta a aceleração no momento exato e na quantidade certa, leva-nos a não usar a possibilidade de o desativar.

Agradável é o som proveniente do escape, cujo volume aumenta naturalmente com a rotação, mas vai alterando o seu timbre, cada vez mais agudo e sugestivo. Muito bom, igualmente, o funcionamento do ‘quick shifter’ bidirecional desta Suzuki GSX-8T. É uma garantia de que não vamos ter suores frios, e que podemos continuar a contar como foi. Esta excitação só é possível se as suspensões corresponderem, e é o que acontece.
É certo que não têm afinação de compressão nem de extensão, contando apenas com afinação da pré-carga da mola no mono amortecedor traseiro, mas é suficiente. Com o acerto que traz de origem em nenhum momento senti que o seu funcionamento me estivesse a limitar, e acho que só faltou experimentar lombas acentuadas!
Mas, afinal, ‘quanto é que dá’?
A travagem da Suzuki GSX-8T é potente e doseável, permite entrar em curva a travar que a frente absorve a pancada, libertando-se da pressão da travagem com a mesma previsibilidade com que começou a afundar. O ABS faz-se sentir quando entra em funcionamento, mas prolonga apenas muito ligeiramente a travagem, sem momentos de transição acentuados. Mesmo em condução desportiva, em piso com algumas irregularidades, acaba por ser uma garantia de que não vamos ser surpreendidos.

Em autoestrada, a ausência de proteção na Suzuki GSX-8T não a penaliza em demasia, e a diferença julgo que é mínima relativamente à 8TT. A unidade ensaiada tinha um pequeníssimo defletor por cima do painel, que juntamente com a maior altura do conjunto dianteiro iniciado no depósito de combustível até permitia manter uma velocidade apreciável. Evidentemente que se quiserem ver quanto é que dá, precisam de baixar o tronco para uma posição algo desconfortável, e, mesmo assim, a partir dos 180 km/h a progressão começa a ser lenta.

Quantos aos consumos, tanto da Suzuki GSX-8T como da versão semicarenada 8TT, podem contar com valores em redor dos 4 litros gastos por cada centena de quilómetros percorridos numa utilização normal, sendo fácil pelas características do motor baixar, ainda que ligeiramente, desse registo.

Por forma a permitir uma utilização mais ampla está disponível uma gama de acessórios razoável, com vários tipos de alforges e detalhes de acabamento e configuração. Para os mais acirrados está disponível igualmente um escape Akrapovic, discreto e bem inserido esteticamente no conjunto. Dizer ainda que a Suzuki GSX-8T já está disponível nos concessionários da marca, com um preço de venda a público de 10.499 €, enquanto para a desportiva 8TT o preço ascende aos 11.499 €.
Como notas finais, esta Suzuki GSX-8T representa muito mais do que um acréscimo de oferta na gama estradista iniciado com as versões 8S e 8R. A dinâmica induzida pelas mudanças na posição de condução, alteram definitivamente a sua forma de estar em estrada, sendo mais acessível e abrangente. Para além disso, e como se não bastasse, é, esteticamente, um assombro!

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