Brixton Crossfire 500XC. Um cantinho de paraíso à porta de casa
Autor: Paulo Ribeiro
Agosto 26, 2022
Seguindo a moda das ‘scrambler’ que apregoam uma boa dose de aventura em troca de coisa pouca, a Brixton agarrou na bem conseguida ‘neo-retro’ 500X e criou a Brixton Crossfire 500 XC. Versão com rodas de raios, 19 polegadas na dianteira, pneus cardados e guiador alto que permite partir à procura de um cantinho de…

Seguindo a moda das ‘scrambler’ que apregoam uma boa dose de aventura em troca de coisa pouca, a Brixton agarrou na bem conseguida ‘neo-retro’ 500X e criou a Brixton Crossfire 500 XC. Versão com rodas de raios, 19 polegadas na dianteira, pneus cardados e guiador alto que permite partir à procura de um cantinho de paraíso à porta de casa. Máquina com potência mesmo à medida da carta A2, capaz de brilhar tanto pela emoção (condução agradável e fácil) como pela razão (economia e simplicidade).

- Texto: Paulo Ribeiro
- Fotos: Delfina Brochado
Com o paradigma das motos fabricadas na China a implementar-se de forma consistente e irreversível em todo o Mundo, são cada vez mais as marcas a recorrer aos produtores da Ásia Oriental. E se, numa primeira fase, o preço era o fator determinante, a qualidade vai agora ganhando força acrescida como argumento comercial e empresarial. Criar e desenvolver modelos na Europa, respeitando gostos que, para nós, são mais convencionais, e fabricar nas mega fábricas da China é, assim, uma solução cada vez mais seguida. Por todos, sem exceção!
É o caso da austríaca Brixton, como da espanhola Macbor, das francesas Mash e MITT, das italianas Benelli, FB Mondial ou SWM. E da belga Bluroc, das inglesas MUTT e Royal Alloy ou da norte-americana UM. Todas oriundas de linhas de produção instaladas no país mais populoso do Mundo.

As diferenças estão no nível de qualidade do produto final, no maior ou menor envolvimento das marcas no processo produtivo e, claro, no capítulo estético. No caso da Brixton, marca própria do importante grupo KSR (que detém ainda marcas como a Motron ou a Malaguti), todo o desenho e desenvolvimento é feito na Áustria. Com uma aposta passa por um assumido design neoclássico e nome de condizente sonoridade britânica.
Brixton Crossfire 500XC com imagem dos ‘sixties’
O tom ‘very british’ com que deve ser pronunciado o nome Brixton remete de imediato para as ‘oll ladies’ que marcaram a história das duas rodas. Da Matchless à Vincent, da Brough Superior à Royal Enfield, da AJS à BSA, da Norton à Triumph. E a imagem da nova Brixton Crossfire 500XC, sólida e com primazia estética repartida entre o motor negro e o imponente depósito, também remete para o espírito da ‘velha Albion’.

A fórmula é igual à nossa conhecida Brixton Crossfire 500X, com banco plano, escape em aço inoxidável ligeiramente inclinado, jantes com raios exteriores (permitindo montagem de pneus tubeless) e depósito (de 13,5 L.) de alumínio marcado por um visível X como incontornável marca de água. Elo de ADN familiar em modelo cujas diferenças sugerem um espírito mais rebelde, a começar pelo guarda lamas dianteiro em posição mais elevada. Mas também pelo guiador mais alto, pneus (110/80 x 19” e 150/60 x 17”) de perfil mais ‘off-road’, placas laterais e o porta números frontal.






Sem esquecer a roda dianteira de 21 polegadas que acrescenta mais uns milímetros à altura já aumentada pelo maior curso da forqueta dianteira. E assim somos chegados aos 839 mm de distância até ao solo do banco (contra os 795 mm da 500X). Assento plano e bastante rijo, capaz de colocar em respeito condutores com menos de metro e setenta. Dificuldades acrescidas pela largura do depósito e da parte frontal do banco, obrigando a afastar mais as pernas e aumentando as dificuldades em cada paragem.

Fácil e agradável desde o primeiro contacto
Independentemente da altura ao solo da Brixton Crossfire 500XC, aquilo que todos vão encontrar é uma agradável posição de condução. As costas ficam bem direitas e os punhos caem de forma descontraída em guiador mais alto e largo. E que pode ser facilmente ajustado para agradar a gregos e troianos. Basta uma chave Umbrako para desapertar quatro parafusos e seguir os traços marcados no conjunto da direção para máximo rigor.
O ajuste pode prosseguir nas manetes, aproveitando a possibilidade de afinação tanto da embraiagem como do travão dianteiro, buscando um elevado nível de comodidade. Posição descontraída, com os pés centrados de forma natural, que reforça a boa brecagem, garantindo, com o apoio do guiador lardo, uma elevada manobrabilidade
Nota ainda para a boa imagem conferida por detalhes interessantes, do X gravado nas borrachas dos poisa pés às proteções laterais do depósito de combustível. Sem deixar passar o cuidado tampão da gasolina. Há, no entanto, pormenores que nos deixam a pensar. Ora, se a placa de proteção do radiador, o guarda lamas frontal e traseiro cortados ou os piscas minimalistas dão ideia de uma intervenção técnico artística, porque não recorrer a retrovisores imbuídos do mesmo espírito? Questão de homologação, poderão dizer. Mas a verdade é que há soluções esteticamente mais agradáveis e com menor interferência no trânsito. Onde a exagerada largura implica com os retrovisores de alguns carros, nomeadamente os SUV.


Lugar entre o amor e a necessidade
E mais ainda poderíamos conversar sobre as ‘crash-bars’… Essas barras metálicas de proteção ao motor que reforçam apelo aventureiro, é verdade. Mas contribuem para o aumento de peso de 5 kg, com total de 195 kg em ordem de marcha face aos 190 kg da X. Além de dificultarem ou, pelo menos, intimidarem na passagem entre carros, com receio de ficar entalado. Paradoxo entre minimalismo e exageros dimensionais que chega ao atraente painel frontal. Placa que denota mais preocupações estéticas do que aspetos práticos, com uma proteção aerodinâmica praticamente irrelevante.

Cuidados de imagem que roçam atitude narcisista, deixando mesmo transparecer algum egoísmo em máquina claramente pensada para o condutor. Está homologada para dois ocupantes e tem estrutura para isso, mas essa filosofia talvez ajude a compreender a posição menos conseguida para o passageiro/a. O banco, além de duro, oferece pouco espaço atrás e as pernas vão demasiado dobradas aumentando o cansaço e dificultando a segurança. Até porque não existem pegas para as mãos!
Claro que, aqui chegados, poderíamos argumentar com o romantismo de ver a pendura agarradinha ao condutor. Mas realmente convém haver amor para aguentar as viagens mais longas. Que não são, manifestamente, o habitat natural da Brixton Crosssfire 500XC, antes preferindo as escapadas para descobertas aventureiras ou as ligações interurbanas. Sendo que, neste caso, é possível responder à necessidade da utilização regular a dois ou de uma boleia esporádica.

Para isso existe uma ciclística extremamente resistente e um motor capaz de responder, sem hesitações e com eficácia, ao transporte de dois adultos. Um bloco especificamente desenvolvido para responder a vários requisitos como a economia, fiabilidade e facilidade de utilização. Além da possibilidade de permitir, diretamente, o acesso aos encartados A2.
Resposta serena, mas decidida
Um bicilindro paralelo, de 486 cc, em linha com a oferta da concorrência, com potência máxima de 35 kW (46,2 cv/8500 rpm). Garantia de uma resposta suave mas decidida desde as mais baixas rotações. Nas relações mais curtas é possível acelerar desde as 2000 rpm e sentir, desde logo, a entrega de potência sem grandes hesitações. Apenas na 5.ª e, sobretudo, na 6.ª velocidade convém não deixar cair o regime abaixo das 3000 rpm, evitando o matraquear dos pistões, para ganhar rotações rapidamente até às 5000 rpm.

Altura em que surge a maior dose de animação, com recuperações que, sem serem esfuziantes, são suficientes para acrescida diversão. É nos regimes intermédios que esta Brixton Crossfire 500XC está mais à vontade, quando surge o valor máximo de binário (43 Nm/6750 rpm) capaz de dar resposta a todas as solicitações. Mesmo com dois ocupantes a bordo!
É também por esta altura que escapam algumas vibrações das borrachas dos poisa pés, ainda assim pouco incomodativas e sem beliscar a suavidade geral de um motor bem interessante. E cujo desfasamento da ignição (270º) entre os dois cilindros proporciona uma sonoridade grave e possante. Música saída de uma ponteira de escape de linhas clássicas, de bom acabamento e aspeto geral, e que diz mais sobre o motor do que propriamente as performances anunciadas pela ficha técnica. Bloco que funciona como elemento portante e que é capaz de prestações mais do que suficientes para o tipo de utilização prevista, com uma velocidade máxima superior a 160 km/h.
Sem eletrónica mas com boa economia
Despojada de eletrónica para lá dos obrigatórios sistemas de ABS (Bosch) e de injeção eletrónica (Delphi), a Brixton Crossfire 500XC beneficia ainda de uma caixa de velocidades com relações curtas para oferecer uma maior vivacidade. O que, por outro lado, obriga a maior recurso à embraiagem, sobretudo em percursos urbanos, e naturalmente a maior utilização da caixa.
Elemento que, ao contrário do que tínhamos constatado na 500X, revelou-se algo ruidosa, sobretudo ao engatar a primeira e na passagem para a segunda velocidade. Funcionamento menos suave e regular que pode ficar a dever-se aos poucos quilómetros da unidade testada, ainda dentro do período de rodagem.

Curiosamente, aquilo por que não esperávamos era um consumo tão comedido, sobretudo por se tratar de um motor muito novo. Apetite frugal, ao nível do anunciado pela marca, registando uma média de 3,96 L/100 km entre postos de abastecimento. Única forma de aferir este valor já que o pequeno mas bem legível painel de instrumentos, um LCD de fundo negro e carateres brancos, não possui qualquer indicador sobre consumos. Tem nível de combustível e luz de reserva, claro, mas nada sobre medição da gasolina gasta, em termos instantâneos ou médios. Nada que incomode quem busca uma forma simples, divertida e económica de mobilidade. Que oferece ainda a possibilidade de grandes aventuras… à porta de casa. Mas sem abdicar de princípios de segurança e conforto.
Amortecimento regulável
Podemos aqui voltar um pouco atrás para recordar que o banco está longe de ser o indicado para ir de Valença até ao Algarve. Sobretudo se for de uma penada só, mas há outras formas de aferir o bem-estar a bordo. E, aqui, não podemos descurar o sistema de amortecimento, fator de peso preponderante no conforto. Sem esquecer que o seu funcionamento interfere com o comportamento dinâmico de qualquer moto.


No caso da Brixton Crossfire 500XC, está melhor neste capítulo do que naquilo que ao bem-estar diz respeito. A explicação assenta, uma vez mais, na qualidade dos componentes, talvez excessiva para uma máquina que se quer simples. A forquilha invertida KYB (Kayaba) oferece 150 mm de curso (mais 20 mm do que a X) e, com o ajuste original, mostra-se particularmente dura. A possibilidade de afinação integral do elemento dianteiro (pré-carga, compressão e extensão) permite encontrar o ‘set-up’ mais adequado de forma simples, com uma simples chave de fendas.
Tanto mais que as função de compressão e extensão são separadas – tecnologia bem conhecida de algumas motos com outros atributos desportivos mas rara neste patamar… – e ajustáveis no topo das bainhas. De origem surgem calibradas a meio dos 18 níveis, sendo que a frente ganha em suavidade ao baixar 4 ou 5 clicks no sentido mais macio. E isto sem perder a compostura ou ficar demasiado bamboleante.
Já atrás, o mono amortecedor da mesma marca permite também regulação de pré-carga, recaindo a aposta no mesmo sentido. Bastam 5 ou 6 meias-voltas para mudar substancialmente o feeling. Mais macia, a cerca de 8 de dureza de 24 pontos….
Economia com qualidade
Suspensão mais desportiva que confortável, tal como sucede com os pneus, os Pirelli Scorpion STR Rally (em vez dos Angel ST montados na 500X) que, num primeiro contacto, parecem atirar em demasia para o interior da curva. Comportamento muito desportivo, mais próprio de algumas estradistas, tal como sucede com a travagem. Excelente com o equipamento, bem conhecido do mercado, produzido pela espanhola J.Juan (recentemente adquirida pelo grupo Brembo), e que é semelhante, entre outras, ao utilizado na KTM 790.
O que não deixa de ser referência elogiosa para uma máquina como a Brixton Crossfire 500XC, apenas disponível numa cor, que custa 7779 euros, mais 500 € face à versão X. Que esgrime vários argumentos de peso num mercado em constante mutação, com imagem de acordo com os cânones da moda e conjunto mecânico qua alia simplicidade e eficácia. Motor competente e ciclística honesta numa máquina que extravasa as suas competências de mobilidade urbana quotidiana permitindo exploradoras aventuras rumo a novos paraísos… à porta de casa.
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