Moto Morini X-Cape. Compromisso à italiana
Autor: Paulo Ribeiro
Fevereiro 20, 2023
É mais uma proposta, diferenciada, no populoso e competitivo segmento das ‘crossover’ de média cilindrada. Onde há oferta para todos os gostos e experiências, ambições e carteiras. A Moto Morini X-Cape 649 representa uma nova etapa na atribulada vida do veterano fabricante italiano. Renascimento com promessas fortes no capítulo comercial sustentadas por um bom comportamento…

É mais uma proposta, diferenciada, no populoso e competitivo segmento das ‘crossover’ de média cilindrada. Onde há oferta para todos os gostos e experiências, ambições e carteiras. A Moto Morini X-Cape 649 representa uma nova etapa na atribulada vida do veterano fabricante italiano. Renascimento com promessas fortes no capítulo comercial sustentadas por um bom comportamento dinâmico. E por uma estética que desperta muitas atenções.

- Texto: Paulo Ribeiro
- Fotos: Delfina Brochado
Ainda que o nome remeta para as maiores aventuras fora de estrada, a verdade é que a Moto Morini X-Cape é, acima de tudo, excelente intérprete de tranquilas fugas turísticas. Daquelas onde o asfalto é rei e as saídas do tapete negro são para o acesso pontual a miradouros ímpares ou aos castelos em locais mais inóspitos. Este é um ‘ponto de ordem’ que se impõe na análise desta ‘italiana’ nascida a Oriente, como quase todas – se não mesmo todas… – as concorrentes diretas.

Um compromisso à italiana, cuja tradução literal do nome representa a fuga mais desejada. Escape aventureiro face ao stress do quotidiano, proposta para viagens em todo o tipo de terreno e que não se intimida quando o asfalto termina. Interpretação transalpina para uma classe onde não faltam concorrentes diretas como a Kawasaki Versys 650, CFMOTO 650MT, Suzuki DL650 V-Strom ou Yamaha Tracer7. Ou, alargando o leque de opções, e salvaguardando questões de potência e/ou preço, incluindo ainda a Yamaha Teneré 700. Mas também a nova Honda XL750 Transalp ou a futura Benelli TRK800 e até algumas 500 cc (Honda CB X, Macbor Montana XR5 ou Mitt TT).
Elegância à italiana
A vocação essencialmente estradista desta máquina está, aliás, bem patente na estética, ainda que vários pontos a remetam para as mais ousadas aventuras. Mas, já lá vamos… Antes, analisar os volumes amplos e linhas vincadas que a distinguem, com uma decoração que exalta valores do conceituado design transalpino. E com plásticos que, além da eficácia na proteção aerodinâmica ao nível das pernas, reforçam o feeling de grande qualidade construtiva.

Cuidados estéticos que se estendem ao capítulo ergonómico, com uma boa posição de condução, de origem trail. De costas direitas e pés ligeiramente para trás, encontramos um guiador largo e que, com fácil ajuste com recurso a chave Allen de 6 mm, adapta-se a condutores de todas as alturas. Por falar em centímetros, de notar que, não sendo baixa, oferece uma distância do banco ao solo (845 mm) que permite razoável à vontade. Bastante confortável e sem ser excessivamente estreito na ligação ao depósito, apenas chamará atenções na hora das manobras. Um banco que favorece a condução em TT, de perfil plano e com uma altura aos pés que facilita no momento de levantar e de guiar de pé.

Nessa altura, aconselha-se cuidado acrescido para não ‘perder o pé’ no controle dos 213 kg que anuncia a seco. O que, sem ser um peso-pluma mas alinhado pelas rivais, é disfarçado por um bom equilíbrio geral e um centro de gravidade razoavelmente baixo.
Referências de distinção
Sentados num banco confortável e de excelentes acabamentos, também para o passageiro que desfruta de bem colocadas pegas para as mãos, tempo para apreciar o posto de condução. De nota muito elevada! O painel TFT de 7 polegadas arranca com uma interessante animação com imagem da Moto Morini X-Cape e oferece várias possibilidades de ajuste. Na iluminação e contraste como no grafismo, mas sempre com elevada legibilidade e de fácil controlo. E é muito completo, incluindo o sistema de controlo de pressão dos pneus para além dos ‘normais’ odómetro (total e dois parciais), conta-rotações, temperatura do líquido de arrefecimento do motor e relógio. Além do nível de combustível de barras, com grafismo que podia ser mais evidente e preciso, a velocidade engrenada e, ‘last but not least’, as indicações de conetividade. Que permitem ligação ao telemóvel, audição de música ou navegação por GPS espelhado no ecrã

Os comandos, bem desenhados e de bom toque, são, imagine-se, retro iluminados. Um luxo que raramente se vê em máquinas de outras patamares e preços que vão para lá do dobro! Nota para a fácil regulação, com uma mão, do ecrã, oferecedor de boa proteção ao peito, mas apenas mediana aos ombros e cabeça. Detalhe facilmente melhorável para os grandes viajantes, com adoção de ecrã opcional…
Ajustáveis de forma fácil são também as manetes, enquanto os punhos, confortáveis, ostentam em relevo o nome da marca, num toque distintivo. Toque de classe que é acompanhado por várias referências MM, no tampão da gasolina como nas tampas de motor, na base da forqueta, na luz de matrícula ou, mais curioso, nas borrachas dos poisa-pés do condutor.
Solidez qualitativa
A qualidade percecionada é, aliás, um dos fortíssimos trunfos da Moto Morini X-Cape 649, dotada de potente iluminação ‘full’ Led e sistema DRL (Daytime Running Light) e com duas tomadas USB para carga dos ‘gadgets’ eletrónicos. E basta olhar para o trem dianteiro para confirmar essa perceção qualitativa.










A forqueta invertida Marzocchi tem um generoso diâmetro de 50 mm e é inteiramente regulável. Em pré-carga, com uma chave de luneta, como em compressão, com chave de fendas na jarra esquerda, e em extensão (‘rebound’) no lado direito. Com total de 4 voltas em cada um dos lados, basta um pouco de paciência para acertar com o melhor ajuste para o gosto individual de condução. Sendo que, independentemente da regulação, a dianteira revela sempre enorme solidez e oferece um excelente ‘feedback’ sobre o que a roda da frente vai encontrando pelo caminho.


Comportamento que permite usufruir de um conjunto de travagem impressionante. Afinal é fabricado pela Brembo, tem dois discos de 298 mm de diâmetro com pinças de 2 pistões e tubagens reforçadas com malha de aço. Travagem de elogiável potência prejudicada apenas por um tato que não se mostrou no mesmo patamar de eficiência. Assim, a sensação é algo ríspida quando se aperta com força a manete direita, depois de um início de desaceleração quase apático. É provável que possa ser potenciado pelo facto da Moto Morini X-Cape, simpaticamente cedida pela Garagem Central, distribuidor da marca no Porto, ser completamente nova… Atrás, tanto a travagem (disco de 255 mm) como o amortecimento (Kayaba, ajustável em pré-carga e recuperação) cumprem eficazmente o seu papel, ainda que sem o brilhantismo dos componentes agregados à roda dianteira.
Ajustes à vontade do freguês
Pessoalmente, depois de vários quilómetros e diversas experimentações, a melhor solução foi encontrada com a forqueta ligeiramente mais macia, tanto na compressão como na recuperação, face ao ajuste de origem. Notam-se menos as irregularidades da estrada, aumentado o conforto, que pode ser incrementado atrás ao descer um pouco abaixo de metade dos 26 ‘clicks’.

Acertos que não interferem com a solidez do conjunto ciclístico assente em quadro construído em tubos de aço, com uma treliça que é reforçada em redor da parte alta do motor. O mesmo acontece na parte onde apoia o braço oscilante em alumínio, com o mono amortecedor posicionado de forma assimétrica. Que, desde logo, chama a atenção pela semelhança com outros modelos… Como a Kawasaki Versys 650 ou a CFMOTO 650MT, afinal, as primas japonesa e chinesa desta bela jovem italiana! Que mais se coloca em evidência pelos ‘sapatos altos’, com aro dianteiro Akront de 19 polegadas e traseiro de 17”, calçados com os Pirelli Scorpion Rally STR. Enquanto as outras ficam-se pelas 17” em ambos os eixos, perdendo de forma natural nas pretensões aventureiras. Ademais, com estas especificações, ganha na agilidade em todo o terreno sem perder estabilidade em estrada. Antes pelo contrário…
A verdade é que se trata de um conjunto de provas dadas e que, no caso da Moto Morini X-Cape surge bastante melhorado no capítulo da ciclística. Isto sem falar da estética, sublinhada pela simplicidade e eficácia das decorações propostas. Do desportivo branco Carrara das fotos ao mais vistoso vermelho Passion passando pelo elegante e discreto cinzento Smoky Anthracite.


Mas, sendo bonita, bem acabada e com componentes que elevam as expetativas, será a X-Cape capaz de cumprir as promessas dinâmicas? Será o motor, de fiabilidade mais que comprovada, suficiente para marcar a diferença no momento da escolha?
Motor de genuína simplicidade
O conhecido bloco de dois cilindros paralelos, de 649,3 cc (83 x 60 mm), dotado de injeção Bosch (mas sem acelerador eletrónico) oferece 60 cavalos às 8250 rotações por minuto e um binário de 56 Nm às 7000 rpm. Trata-se de um motor consistente, com ganho de rotação bastante progressivo e entrega de potência linear, mas sem um ‘punch’ entusiasmante. Longe de ser um portento de acelerações revela-se, antes de mais, fácil de utilizar, permitindo ritmos muito interessantes sem grande cansaço e com bons níveis de economia. ‘Disponível’ a partir das 2500 rpm, é um motor que se deve conduzir de forma ‘redonda’ sem alterações bruscas na rotação. Seja em aceleração como no corte de gás. Máquina para passear, com grande conforto e muito estilo, que brilha mais pela suavidade e eficácia dinâmica do que pelas prestações.
Não se pense, porém, que é um motor amorfo, pastelão! Nada disso. É, isso sim, um bloco ‘genuíno’, sem eletrónica capaz de esconder alguma aspereza. As vibrações, por exemplo, que existem em todos os motores, fazem aqui sentir-se nos pés a partir das 6000 rpm. Eventualmente chegam ao guiador quando o ritmo sobre para lá das 8000 rpm. Sensação de ligeiro formigueiro que é rapidamente esquecida ao ouvir a música que sai do bonito escape. Um timbre de irregular rouquidão, remetendo para um espírito mais próximo dos V2, mas sem ser cansativo nas tiradas mais longas. Além disso, nas estradas mais recurvadas, é possível tirar máximo partido do motor, graças à maneabilidade e facilidade de colocação em curva proporcionada pela curta distância entre eixos (1470 mm) e pela firmeza do trem dianteiro.
Modos de condução… ou de painel?
Motor que surge agregado a caixa de velocidades que é conhecida pelo toque metálico nas mudanças, e uma embraiagem, de acionamento mecânico, algo brusca. Além disso conta com dois modos de condução que determinam mudanças significativas… no painel de instrumentos.








Na verdade, a única verdadeira alteração entre os dois modos (Ride e Off-Road) fica patente no grafismo do ecrã. Bem mais interessante no desenho ligado ao fora-de-estrada, diga-se em abono da verdade. Duas notas para recordar que, com a potência disponível e o próprio comportamento (linear) da unidade motriz, a existência de modos não faria grande sentido. Por outro lado, a ausência do ‘ride-by-wire’ complica grandemente a adoção dessas variações eletrónicas.

Existe, porém, uma diferença importante, essa sim significativa nos caminhos de terra! O ABS Bosch 9.1MB pode ser desligado apenas no modo Off-Road, permitindo maior diversão e eficácia para os mais experientes nestas aventuras. E que, assim, poderão tirar maior partido da razoável distância do motor ao solo (190 mm) ou do generoso curso das suspensões (175 mm à frente e 165 mm atrás) em prol de maior diversão.
Rumo à aventura e mais além
Utilizadores que podem ainda reforçar aspirações aventureiras da Moto Morini X-Cape 649 com a montagem de alguns opcionais da marca. Da proteção do cárter em alumínio às barras de proteção do motor ou às proteções de mãos. Mas que, nesta unidade, pertencem ao catálogo da portuguesa Crosspro, com garantia de superior qualidade e preço mais competitivo. Contando ainda com a proteção do radiador e o alargador do descanso lateral à proteção inferior (‘skid plate’), barras laterais (‘crash-bars’).


Para reforçar o epíteto Adventouring que a casa italiana orgulhosamente colou nos flancos da X-Cape, existe um banco mais baixo (820 mm), o ecrã frontal mais alto e largo (Touring Windscreen) e os punhos aquecidos. Bem como, claro está, do ‘indispensável’ conjunto de malas e respetivos suportes.
Que, naturalmente, subirão o preço acima dos 7800 euros para a versão base, reforçando, porém, a verdadeira vocação do excelente compromisso italiano. Principalmente por ser uma moto capaz das maiores viagens em estrada como de alguma evasão em caminhos de terra, juntando bom nível de conforto a um ‘apetite moderado’. Afinal, a média de 5,13 litros por cada centena de quilómetros percorridos foi conseguida em percursos muito variados, da cidade ao ‘light off-road’, quase sempre com passageiro e com uma unidade completamente nova. Que, em suma, cumpriu as mais exigentes expetativas em termos dinâmicos, revelando maior à vontade quando a velocidade aumenta, exaltando uma solidez referencial no segmento.
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