Royal Enfield Classic 650. Nostalgia de Lés-a-Lés

Autor:  Paulo Ribeiro

Maio 22, 2025

Mais do que uma neo-retro ou simples versão revivalista, a Royal Enfield Classic 650 Twin apresenta-se como uma clássica genuína. Uma máquina com surpreendente capacidade de fazer quilómetros de forma divertida, pouco cansativa e com muito estilo. Um espírito e filosofia bem patentes desde o primeiro momento, sentindo um simpático molejar quando nos sentamos no assento individual, até ao final do 1º Portugal de Lés-a-Lés Classic, palco de um teste longo, intenso e… muito molhado.

Royal Enfield Classic 650
Royal Enfield Classic 650. Nostalgia de Lés-a-Lés 30
  • Texto: Paulo Ribeiro
  • Fotos Luís Carvalho e Paulo Ministro

Foi um desafio diferente, o teste à Royal Enfield Classic 650! Fazê-lo em poucos quilómetros poderia condicionar a análise à vertente estética, minimizando parâmetros de grande importância quando se compra um moto para a vida. Sim, porque dificilmente algum utilizador da Royal Enfield Classic 650 se vai desfazer dela, atirando-a para uma qualquer secção de venda de usados! Por isso, nada como cumprir mais de um milhar de quilómetros, com a aventura turística organizada pela Federação de Motociclismo de Portugal bem no centro da ação. Palco de eleição para um ensaio de longa duração, repetindo uma fórmula já conhecida, entre muitas outras, da Royal Enfield Himalayan no 6.º Portugal de Lés-a-Lés Off-Road

Royal Enfield Classic 650
Royal Enfield Classic 650. Nostalgia de Lés-a-Lés 31

Antes de mais, um pouco de história para melhor entender o conceito. A origem da Royal Enfield Classic 650 pode encontrar-se na 500 Twin de 1948, a primeira bicilíndrica da marca ainda britânica, numa fusão entre espírito clássico e engenharia moderna. E assim proporcionando uma experiência ímpar, juntando o charme de outros tempos com a eficiência normalizada nos dias que correm. Tarefa que a marca indiana vem levando a cabo desde 2017, com a remodelação da gama, com motores bicilíndricos de 650 e monocilíndricos de 350 e 450, de construção tão sólida e fiável, quanto discretas são as suas prestações.

Amor à primeira vista?

As primeiras impressões criadas Royal Enfield Classic 650 são particularmente agradáveis. Ainda no bonito espaço da Royal Enfield Porto o primeiro olhar revela-nos uma máquina com grande estilo, linhas elegantes e acabamentos de bom nível. Um design de estilo vintage onde não faltam (nem poderiam faltar…) os guarda-lamas arredondados cobrindo grande parte dos pneus, grande profusão de cromados e um depósito com formato de gota. Bom gosto clássico que é sublinhado pelas duas longas saídas de escape cromadas, elementos diferenciadores e com forte impacto visual. Impressão mais visual do que sonoro, sublinhe-se, atendendo às castradoras exigências da legislação no que às emissões diz respeito.

Royal Enfield Classic 650
Royal Enfield Classic 650. Nostalgia de Lés-a-Lés 32

Imagem vincadamente retro que pode ainda ser mais evidenciada, retirando o assento do passageiro e os suportes metálicos tubulares do mesmo, deixando à vista o generoso guarda-lamas. Surpreendente é também a qualidade da pintura, de aspeto brilhante e inspirador de tranquilidade quanto à sua durabilidade, bem como dos anodizados e revestimentos cromados. Como os retrovisores, com um bem clássico design redondo e que, apesar da área limitada do espelho, são do melhor em termos de visibilidade e ausência de vibrações.

Royal Enfield Classic 650
Royal Enfield Classic 650. Nostalgia de Lés-a-Lés 33

Tantas notas vintage nesta Royal Enfield Classic 650 que parece faltar apenas o kick-starter para termos uma genuína moto clássica e onde não destoam os faróis, redondos e em LED com muito boa capacidade de iluminação, enquadrados pelos piscas também de tradicional formato redondo mas com lâmpadas incandescentes.

Um banco para conforto a longo prazo

Sensação que é reforçada pelos bancos individuais, cujo primeiro contacto proporcionou uma inusitada descoberta. De boa dimensão e bastante acessível em relação à altura ao solo (800 mm), a Royal Enfield Classic 650 oferece um toque que faz lembrar os assentos da vetusta 500 Twin com molas. Característica que ajudou imenso ao longo dos muitos quilómetros em pisos variados e que, por vezes, estiveram longe do aveludado tapete que mereciam muitas das veteranas do Portugal de Lés-a-Lés Classic. Um assento que ia filtrando algumas limitações da suspensão, ampliadas pelo peso de quase 250 kg com depósito cheio e pelo majestoso comprimento de 2318 mm.

Royal Enfield Classic 650 Twin 75 - MotoX

Royal Enfield Classic 650

Royal Enfield Classic 650 Twin 69 - MotoX

Royal Enfield Classic 650

Peso que é facilmente controlado por condutores de todas as alturas graças à facilidade em colocar os pés no chão, enquanto o assento revelou surpreendente conforto em viagem. O que foi confirmado pelo bom estado das costas em toda a sua extensão, do pescoço até ao rabo, após a ligação de 220 km non-stop, com alguma autoestrada e o sempre divertido IP4 pelo meio. O maior cansaço sentiu-se, aliás, no pescoço (percebem porque os motociclistas antigos tinham pescoços de lutadores?), nos ombros e braços, pela completa ausência de proteção aerodinâmica.

Royal Enfield Classic 650
Royal Enfield Classic 650. Nostalgia de Lés-a-Lés 34

Claro que este é efeito diretamente proporcional à velocidade de cruzeiro, sendo que é perfeitamente tolerável mantendo a Royal Enfield Classic 650 dentro dos limites legais. Além disso, pode sempre escolher um para-brisas na extensa lista de acessórios, que conta ainda com várias opções de assentos e soluções para transporte de bagagem.

Modernidade escondida sob imagem antiga

Com uma ciclística herdada, em termos gerais, da Super Meteor 650, assente num bem tradicional duplo berço em tubos de aço, destaque para o amortecimento providenciado pela Showa. A forquilha telescópica de 43 mm de diâmetro e 120 mm de curso, disfarçada pelas capas exteriores, e os dois amortecedores, ajustáveis em pré-carga, que permitem um deslocamento de 90 mm à roda traseira, são eficazes em todas as situações dinâmicas, pecando apenas por um início de curso algo ríspido. Característica que o passar dos quilómetros deverá diluir (esta unidade ainda não tinha 500 km quando a levantamos) ou, pelo menos, ajudar a esquecer num conjunto que, apesar de tudo, pretende privilegiar o conforto.

A melhor estratégia passa por manter ritmos clássicos, sem exageros desportivos ou aventureiros, conseguindo assim uma utilização divertida e bastante turística. Filosofia de viagem que ajudará a poupar a pintura dos descansos (sim, são dois, porque o central também é montado de origem) e até os cromados dos escapes, minimizando os toques no asfalto. É que, apesar da razoável altura livre ao solo (154 mm), o baixo centro de gravidade numa ciclística pensada para o conforto, levam os avisadores a cumprir o seu papel. Raspam com alguma facilidade nas curvas mais rápidas, especialmente com pisos mais acidentados, em caso de entusiasmo pouco condizente com o espírito da Royal Enfield Classic 650 Twin, aconselhando uma condução… mais conservadora.

Royal Enfield Classic 650
Royal Enfield Classic 650. Nostalgia de Lés-a-Lés 37

Mescla perfeita entre o clássico e o moderno

O que até é promovido pela posição de condução, descontraída e razoavelmente confortável, apoiada num guiador largo (892 mm) e relaxado, que proporciona um bom controlo. E facilita a abordagem inicial, com posição próxima de uma cruiser com poisa-pés em posição central, evitando dobrar as pernas em demasia. Com uma ergonomia bem conseguida, a Royal Enfield Classic 650 tem comandos bastante acessíveis mesmo com luvas de chuva que, por outro lado, exponenciam o diâmetro dos punhos, algo grossos para quem tem as mãos mais pequenas. O que poderá ser mais cansativo em deslocações longas além de umas manetes espessas, mas com prático sistema de ajuste em distância.

Royal Enfield Classic 650
Royal Enfield Classic 650. Nostalgia de Lés-a-Lés 38

Ainda no posto de comando, um olhar sobre o painel da Royal Enfield Classic 650 revela a mescla perfeita entre o clássico e o moderno, com um grande velocímetro analógico, redondo e com bordadura cromada, pois claro, acompanhado de uma pequena janela digital. Que mostra o nível de gasolina, a velocidade engrenada, o totalizador de quilómetros e dois parciais. Mesmo ao lado, e de forma simétrica ao canhão de ignição, outra janela eletrónica conta com um prático relógio e permite ainda visualizar o sistema de navegação Tripper, acessível através da aplicação da marca graças à conetividade por Bluetooth.

Motor de provas dadas

Mas vamos para a estrada que é o que esta Royal Enfield Classic 650 mais quer. O toque no botão de arranque desperta, de forma imediata, o bloco de dois cilindros paralelos de 648 cc,  (78 mm x 67,8 mm) com uma árvore de cames à cabeça, duas válvulas por cilindro, refrigerado por ar e óleo e com injeção eletrónica. O som que sai das ponteiras dos dois longos escapes é possante ainda que abafado por força do cumprimento da normativa Euro5 e denota grande força envolvida em enorme suavidade. Afinal, mais do que os 47 cavalos às 7250 rpm, sobressai o binário de 52,3 Nm às 5650 rpm.

Royal Enfield Classic 650
Royal Enfield Classic 650. Nostalgia de Lés-a-Lés 41

Bloco já conhecido da Meteor 650, mas com algumas alterações que parecem ter reforçado o equilíbrio geral. Com uma embraiagem leve e controlável, pressiona-se o seletor de velocidades, com um clank que garante o bom engate da primeira velocidade, e logo se sente a força da Royal Enfield Classic 650. A disponibilidade desde as mais baixas rotações é surpreendente e as vibrações nada incomodativas, surgindo apenas um ligeiro formigueiro nos pés quando se explora mais o fundo este propulsor. Sensação que não chega às mãos graças a um guiador bem isolado e não afeta a leitura do painel ou a visibilidade dos retrovisores

Royal Enfield Classic 650
Royal Enfield Classic 650. Nostalgia de Lés-a-Lés 42

A suavidade e a agradável entrega de potência desde os regimes mais baixos perdoam a menor disponibilidade nas rotações mais altas, mostrando que o habitat natural da Royal Enfield Classic 650 passa, para lá do grande à vontade em cidade, pelas estradas mais tranquilas, com bastantes curvas. Como os caminhos que ligam as muitas aldeias do Parque Natural do Montesinho ou a deliciosa subida da N304, entre Mondim de Basto e a Campeã.

Royal Enfield Classic 650
Royal Enfield Classic 650. Nostalgia de Lés-a-Lés 43

Um motor agradável, com a cambota a ditar a ignição desfasada a 270°, competente em baixas e médias rotações, e que acabou por revelar-se, de forma natural e esperada, menos confortável em estradas mais rápidas. Onde a reserva de potência fica escassa para ultrapassagens de última hora, forçando a utilização da caixa de 6 velocidades, com relações curtas.

Royal Enfield Classic 650
Royal Enfield Classic 650. Nostalgia de Lés-a-Lés 44

É certo que a transmissão complementa o caráter descontraído da Royal Enfield Classic 650, permitindo rodar sempre entre os 90 e os 120 km/h desde a saída do Porto até ao Castelo de Bragança. E mesmo sem ser uma turística de eleição, ao subir o IP4, em 6.ª, mostrou força suficiente para, depois de cortar gás, bastar apenas voltar a acelerar para concretizar uma ultrapassagem ao único carro que encontrei na subida do Marão.

Força motriz de grande diversão

Claro que, em contrapartida e não tendo alma desportiva, convém manter engrenada a velocidade mais adequada para evitar surpresas à saída de uma curva, quando se procura manter um ritmo mais elevado. O melhor mesmo é aproveitar as estradinhas mais recurvadas para apreciar a paisagem e desfrutar do ambiente, garantindo grande diversão a velocidades contidas. Que, além do mais, ajudaram a evitar sustos quando ovelhas, cães, vacas e até cavalos decidiram atravessar a estrada nos locais mais inusitados.

Royal Enfield Classic 650
Royal Enfield Classic 650. Nostalgia de Lés-a-Lés 45

Velocidade de cruzeiro que é suficiente para a utilização a que se propõe a Royal Enfield Classic 650, mas que não impede uma velocidade máxima que pode chegar bem para lá dos 150 km/h, adotando uma posição bastante inclinada sobre o farol e painel de instrumentos. Haja braços e, sobretudo, pescoço para isso! Mas também me parece que potência e velocidade são suficientes para aquilo que os potenciais proprietários da Royal Enfield Classic 650 procuram.

Não menos importante será o consumo, sendo que a marca anuncia 4,66 litros de gasolina para cada 100 quilómetros, conseguindo, ainda com uma máquina em fase final de rodagem, uma média real de 4,69 L/100 km, com limites de consumo entre reabastecimentos de 4,25 e 5,00 L/100. O que, olhando ao depósito de 14,8 litros permitirá uma autonomia a rodar os 300 km, mais do que suficientes atendendo à filosofia da Royal Enfield Classic 650.

A Royal Enfield Classic 650 e a eletrónica

Uma filosofia de utilização que volta a ser evidenciada num capítulo particularmente sensível como é o da travagem. Dotada de um disco de 320 mm na dianteira e um de 300 mm atrás, ambos com pinças flutuantes de 2 pistões e com sistema hidráulico (é clássica não é velha…), a Royal Enfield Classic 650 tem uma travagem… suficiente. Na dianteira peca mais pelo tato do que pela potência, exigindo muita pressão na manete, de acionamento algo duro e pouco progressivo. Funcionamento mesmo à antiga ainda que a potência esteja lá, na parte final do curso e depois de comer um bom bife.

Mas, quando se rola de forma mais entusiasmada, o melhor mesmo será recorrer ao travão traseiro, esse simm bastante poderoso e mais reativo, despertando o ABS com alguma facilidade. No entanto, e uma vez mais imaginando-me na pele de um utilizador convencional da Royal Enfield Classic 650, esta potência de desaceleração será bem suficiente e as exigências de utilização serão vistas como algo normal.

Royal Enfield Classic 650 Twin 50 - MotoX

Royal Enfield Classic 650 Twin 53 - MotoX

Royal Enfield Classic 650 Twin 58 - MotoX

Royal Enfield Classic 650 Twin 61 - MotoX

Royal Enfield Classic 650 Twin 70 - MotoX

O mesmo se passará, seguramente, com a dotação eletrónica que se limita ao obrigatório ABS, ao dispositivo de navegação Tripper e a uma tomada de carregamento USB (escondida sob a tampa lateral), não existindo controle de tração ou modos de pilotagem. Na verdade, também não são realmente necessários na Royal Enfield Classic 650…

Desconfiança vestida de negro

Por outro lado, poderão olhar desconfiados para os desconhecidos pneus MRF Nylohigh. Eu também olhei de lado! Ao contrário dos Pirelli utilizados nas outras propostas com este motor, a opção, de maior classicismo, passou pelas borrachas fabricadas pela Madras Rubber Factory. Pesquisando um pouco, descobre-se que a MRF é uma gigantesca empresa indiana que vende milhões de pneus para automóveis, camiões, tratores e até aviões. Além de estar bastante ligada às corridas de carros.

Royal Enfield Classic 650
Royal Enfield Classic 650. Nostalgia de Lés-a-Lés 48

Ora, sendo a primeira vez que utilizava estes pneus, dediquei-lhes alguma atenção especial. Numa fase inicial, pensei que a tendência da roda dianteira em cair para o interior da curva poderia ser devida à configuração da carcaça, pouco arredondada. No entanto, com o passar dos quilómetros, ficou claro que tem mais a ver com a dimensão do próprio pneu de 100/90, em roda de 19 polegadas, enquanto atrás monta um 140/70 x 18”.

Royal Enfield Classic 650
Royal Enfield Classic 650. Nostalgia de Lés-a-Lés 49

Bastante bons em piso seco, permitem ir até ao limite físico da moto, raspando os poisa-pés sem darem sinal de fraqueza ou transmitirem qualquer insegurança. De forma gradual, os receios iniciais, ou pelo menos algumas dúvidas face ao desconhecimento absoluto desta marca de pneus, foi desaparecendo. E, embora não sendo brilhantes em termos de aderência ou capacidade de aquecimento, a verdade é que cumpriram na perfeição tudo o que lhes foi exigido. Mesmo perante situações climatéricas tão adversas como as encontradas no Portugal de Lés-a-Lés Classic, nunca revelando falta de confiança em curva.

Capaz de proporcionar uma experiência verdadeiramente descomplexada e nostálgica, a Royal Enfiel Classic 650 brilhou ainda mais na chegada a Lamego, ponto final deste 1.º Portugal de Lés-a-Lés Classic, quando o sol realçou a decoração Teal (verde-azulado). A que se juntam o mais clássico e sóbrio Black Chrome (preto e cromado) e o distinto Vallam Red com bordeaux e marfim.

Esquemas cromáticos inspirados na 500 Twin, mantendo forte ligação à herança da marca, que fazem variar o preço desde os 6.887 € para a versão Vallam Red, mais 100 € para a Teal até aos 7.187 € da Black Chrome. Valores que reforçam o apelo para aqueles que procuram uma clássica de estética apurada, de linhas genuínas e bons acabamentos. Uma moto para viajar sem pressas, com boa relação preço/quilómetro, prometendo momentos de inolvidável nostalgia.

Partilha este artigo!

Moto Guzzi V100
Moto Guzzi V85TT
Aprilia Tuareg 650
Aprilia Tuareg 650
Moto Guzzi V100
Moto Guzzi V85TT
Moto Guzzi V85TT
Moto Guzzi V100
Aprilia Tuareg 650
Pesquisa

Não encontrado