WorldSBK 2022 Motorland: Porque ganha Rea? Bautista pode ganhar amanhã? E o que faltou a Toprak?

‘Corridaço’! É assim que se pode definir a corrida inaugural do Mundial de Superbike de 2022. O trio apontado para a disputa das vitórias cumpriu o que dele se esperava e a corrida foi emotiva de princípio a fim decidindo-se na última curva, como mandam os pergaminhos de uma competição acesa.

Jonathan Rea e a Kawasaki resolveram os problemas que apoquentavam a frente da ZX-10RR Ninja na segunda metade do ano passado. Álvaro Bautista mostrou que o seu retorno à Ducati foi o ás de trunfo da marca de Bolonha. Já o campeão do mundo, soube sofrer numa pista onde as Yamaha YZF-R1 nunca se mostraram muito à vontade

  • Texto: Fernando Pedrinho
  • Fotos: Kawasaki WorldSBK, WorldSBK, Aruba.it Ducati e Fernando Pedrinho

Jonathan Rea entrou no campeonato com o pé direito. A proverbial consistência e rapidez do norte-irlandês encontraram a estabilidade necessária no trem dianteiro da Ninja para nunca desistir de lutar pela vitória, nem que seja até à última curva. O natural de Ballymena, ali mesmo ao lado de Belfast, nunca perdeu o controle da cabeça de corrida, mesmo sabendo que a longa reta do traçado aragonês é como ‘sopa no mel’ para o foguete italiano. Vitória perfeita? “Não, para mim perfeita seria se tivesse partido na frente e cortado a meta isolado”, disse-me o britânico. “Mas adorei a batalha e mostrámos os pontos fortes da nossa moto: ágil e estável na travagem”. O trabalho da pré-época focou-se em fazer trabalhar a gama de Pirelli traseiro macios, como o SCX e o 557 – o pneu de desenvolvimento que se tornou no SCX deste ano. “Consegui manter a rapidez até ao fim sob uma temperatura fresca. Nota que nunca havíamos conseguido tirar rendimento do SCX com uns meros 24º C [de temperatura de asfalto]. Todo o mérito para a equipa da Provec, Kawasaki e para a Showa. É uma grande vitória, não por ser a primeira do campeonato mas como o fizemos e com este pneu”.

“Há três anos o Álvaro deu-me 15 segundos”!

Jonathan confessou mesmo  não se recordar de uma vitória que tenha apreciado tanto como esta. “Há três anos atrás, o Álvaro deu-me 15 segundos com esta moto. Por isso, ganhar nesta pista com ele na Panigale V4R é muito bom para a minha confiança. Esperava terminar no pódio mas vencer é ainda melhor e são 25 pontos logo no arranque”.

E as incontáveis vezes que a moto vermelha passou pela ‘Kawa’? “O que posso eu dizer? A moto é um míssil e ridiculamente rápida. Mas isso não quer dizer que seja a melhor moto da grelha. Podíamos claramente ver o que eu conseguia fazer na travagem e nas mudanças de direção com a ZX-10RR. Também acho que temos melhor tração mecânica que a Ducati. Por outro lado, se é mais difícil para mim nas retas, para ele resulta mais complicado em curva, por isso não me posso queixar muito”. A ultrapassagem na última curva que deu a vitória ao hexacampeão mundial foi o corolário de uma corrida de antologia. “Ele passou por mim tantas vezes na reta que me deu a possibilidade de perceber o que teria de fazer na última volta”, explicou Jonathan. “O Álvaro passava-me a meio da reta, mas dessa vez fê-lo um pouco mais tarde e tentou fechar-me a entrada em curva. Só que travei ainda mais tarde e meti por dentro, tentei fazer-me pequenino e massajar o amortecedor traseiro para não comprometer muito a saída e resultou”.

Campeonato a três?

E será que Jonathan também acha que este vai ser um campeonato a três? “Hoje foi assim, mas tens pilotos como [Garrett] Gerloff, Alex [Lowes], [Michael Ruben] Rinaldi, [Andrea] ou o Locatelli, que irão aparecer em algumas corridas. Contudo, para a época inteira, o Toprak [Razgatlioglu] e o Álvaro [Bautista] vão ser os meus maiores adversários.”

Estratégias em pista era o que todos esperávamos para ver na primeira corrida do campeonato. “Acho que o Toprak queria manter-se na frente da corrida para controlar o ritmo. Não entendi bem o que pretendia o Álvaro, mas a minha estratégia era ripostar de imediato de cada vez que ele me passasse. Se lhe desse uma ou duas décimas, antes da reta grande, e concedesse outro par de décimas, teria de esforçar em demasia o pneu da frente para recolar. Por sorte hoje tinha uma moto que me ajudou muito”.

Bautista está de volta para lutar até ao fim

Se há algo que não se pode acusar Álvaro Bautista é de não ter tentado tudo para vencer, depois de dois anos sabáticos na passagem pela Honda oficial. “Depois de tudo o que passei era muito importante acabar esta corrida”, disse o piloto da Aruba.it Ducati. Espetador da refrega inicial entre Rea e o campeão do mundo em título, Bautista manteve-se calmo, até por que sabia ter ritmo para o final da corrida. “Ao fim de alguma voltas o Toprak ficou mais lento e decidi passá-lo, numa travagem para a primeira curva com as três motos lado a lado. Até tenho as marcas no fato do pneu da frente da Yamaha. Acho que o Jonathan entendeu que não podia deixar-me isolar no comando, mas não me importei com os ‘ataques-resposta’ dele, pois como te disse, apenas queria acabar a corrida e não envolver-me numa luta direta. Esta é apenas a primeira corrida: tinha de assegurar um bom resultado e retirar boas sensações de corrida”.

Ficou claro que se a Ducati é um míssil capaz de alcançar 328 km/h, a Kawasaki tem melhor aceleração na saída de curva. “Perdia em aceleração em todas as curvas”, confessou o piloto de Talavera de la Reina. “Conseguia recuperar em algumas travagens e nas retas, mas de cada vez que o passava na reta longa tinha dificuldades na última curva, sobretudo com o vento que se fazia sentir e empurrava a moto para fora. Nela tentei fechar a linha, mas fiz mais de meia curva com a frente a escorregar e forçá-la para vir para dento, e como a moto do Jonathan gira melhor e tem mais velocidade a meio da trajetória, não foi possível…. Mas foi uma bela corrida e muito divertida. É esta a posição em que tenho de lutar e não o que aconteceu nas duas temporadas anteriores. É uma boa maneira de começar a época”.

Então o que faltou a Álvaro para ganhar? Alguma vez pensou escapar na frente e fazer uma corrida “à lá Bautista”? “Honestamente, nunca pensei nisso. Só queria manter-me na corrida e estar muito concentrado. No par de vezes que andei na frente tive problemas de estabilidade e perdi tempo. Talvez se não viesse da situação que vivi no ano passado tivesse arriscado um pouco mais. Mas tomei a decisão correta”.

Obviamente, importava ‘provocar’ Bautista sobre o único ponto alcançado por Scott Redding na mudança para a BMW, depois de ter lutado pelo Mundial do ano passado, até à penúltima prova. “Sei perfeitamente o que estará a sentir neste momento e conheço a frustração porque estará a passar”, disse o espanhol. “Deixou uma moto que é muito boa e fácil de pilotar até um certo nível. Além disso, mudar de um V4 para um quatro em linha… deve estar a sentir o que senti nos últimos dois anos. O que tem a fazer é trabalhar para adaptar o seu estilo de pilotagem à moto e tirar o máximo proveito do que ela pode dar. Foi que tentei fazer na Honda”.

O sofrimento do campeão do mundo

Toprak Razgatlioglu é a estrela do momento. Quebrou a série de títulos mundiais de Jonathan Rea e é apontado por toda a gente à equipa oficial da Yamaha na MotoGP, sobretudo se Fabio Quartararo resolver bater com a porta. Mas sabia-se que o arranque do campeonato em Motorland seria tudo menos ‘pera fácil’ para o turco, até porque as YZF-R1 nunca se sentiram como peixe na água no traçado mais longo do mundial.  Terceiro na Sexta-feira, o sultão parecia querer contrariar a tendência do passado ao rubricar a ‘pole position’ na manhã de Sábado. Mas a corrida voltou a determinar uma situação em que o piloto não conseguiu explorar o seu ponto mais forte: a travagem. “Já desde os treinos que vinha a sentir que o pneu da frente perde muito rendimento depois das 10 ou 11 voltas iniciais”, disse-me o piloto da Pata Yamaha with Brixx. “O pneu da frente começa a escorregar demasiado, sobretudo na travagem para a curva 1. É a primeira vez que passo por esta situação na Yamaha, pois costumo gostar muito do Pirelli SC1.” Toprak testou mesmo o novo dianteiro da Pirelli, o SC1 A0674, mas não gostou. “Em condições de maior temperatura esse pneu não é para mim! Sabes que eu gosto de travar forte, mas assim que o pneu dianteiro começa a escorregar nessas circunstâncias, a minha corrida acabou”.

O piloto da moto azul acabou por sacrificar também o pneu traseiro, que na últimas oito voltas decaiu, tal como já vinha sentido na frente, muito de rendimento. “Andei a lutar com a moto em todas as curvas e acabei por me contentar com a terceira posição. Na curva 7 era particularmente complicado, com a frente a ‘fechar’. Apesar de termos melhorado globalmente nesta pista, ainda sou muito lento nos setores 1 e 3. Não sei se no Domingo vamos conseguir mudar muito esta situação, mas voltaremos em Assen mais fortes”.

Mas será de fato o pneu dianteiro a fonte do problema? “Aí é que está a questão: o ‘feeling’ que a frente me transmite é péssimo! Não acho que seja do pneu, porque o ano passado utilizei o SC1 em todas as corridas e nunca senti este problema. Acho que a origem de tudo isto está nas afinações que estamos a utilizar. Como te disse, esperava que o pneu traseiro decaísse para o fim da corrida, mas jamais o dianteiro, apesar de ter sentido isso na simulação de corrida de ontem à tarde”.

E qual é para o natural de Alanya, a melhor moto da grelha? “Não sei” atirou de imediato. “A Yamaha é muito boa nas curvas longas, mas esse não é o meu estilo. A Yamaha costumava devorar o pneu traseiro nesta pista, pelo que estamos a jogar com a eletrónica para controlar esse consumo. A Ducati é rapidíssima nas retas e este ano temos de contar com as Honda e BMW nesse aspeto. A Kawasaki é mais como a Yamaha”.

Com 9 centésimas a separem os dois primeiros, a receita está dada e decididamente: temos campeonato!

Honda NT1100 benzida pela chuva

Confesso não me lembrar de uma viagem que tenha feito de moto em que a chuva não tenha aparecido para dar um ar da sua graça. Esta vinda até ao antigo reino de Aragão não constituiu exceção. Obrigado a ficar a mais de 45 quilómetros para leste do circuito, Monroyo é uma pequena aldeola situada nas montanhas. Durante a noite a chuva veio benzer a NT1100, curiosamente num raio muito limitado, pois após alguns quilómetros de estrada, esta estava seca e ao chegar a Alcaniz o sol marcou a sua presença.

Para a NT1100, com ou sem chuva, vai tudo a eito. Aliás, esta turística vem dotada de uma eletrónica de superbike, com controles de tração, travão-motor, modos de condução e de potência. A minha preferência recai sempre sobre o modo ‘Tour’, com desconexão do controlo de tração, mínimo de travão motor e modo de potência no máximo.

Em estrada nacional a NT1100 tem feio uma média de consumo de 5,3 l/100 km para uma velocidade média de 93 km/h. A sua maneabilidade é notória assim com a facilidade com que nos habituamos ao DCT. Confesso que a falta da manete e pedal direito ainda faz confusão, mas é coisa dos primeiros metros, pois logo entro no modo ’scooter’ e ‘no pasa nada’.

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