Voge 900DSX. Confirmação de Lés-a-Lés

A Voge 900DSX é a mais recente trail de cilindrada média e tem imensos trunfos para ir a jogo com as mais famosas propostas do mercado. Desde logo, um preço imbatível na fase de lançamento a que se junta um nível de equipamento ímpar. Aproveitamos o 26.º Portugal de Lés-a-Lés para efetuar um teste longo e intenso, no mais diverso tipo de pisos e condições. Mas o resultado… não foi surpreendente! Foi, isso sim, a confirmação de um nível de qualidade que pede meças aos modelos europeus ou japoneses!

Voge 900DSX
  • Texto: Paulo Ribeiro
  • Fotos: Luís Freitas Carvalho e Paulo Ministro

Ao olhar para a completa ficha técnica da Voge 900DSX, terminando com o preço a primeira ideia é que se tratava de um erro de impressão. Afinal, o valor total dificilmente pagaria os punhos e assento aquecidos, faróis auxiliares, proteções de motor e de mãos, radar, 4 modos de motor, ABS e controlo de tração (ambos desconetáveis no modo Enduro), ‘cruise-control’, TPMS, duas tomadas USB (tipo A e C) outra de 12V. Isto, claro, optando por outra marca europeia que é, em tudo – mas mesmo tudo! – idêntica ao modelo fabricada pela Loncin.

Que, refira-se, nasceu como fabricante de motores em 1993 e faz motos desde 1998, com um volume anual superior a três milhões de unidades. Dessa forma é um dos maiores fabricantes chineses (e, claro está, a nível mundial!), produzindo ainda alguns modelos para a BMW desde 2005. Nomeadamente as F800 e F900GS bem como as scooters C400X e GT. E que, em 2018, decidiu criar a sua marca própria para combater fora da China, chamando Voge às suas motos de características ‘premium’.

Equipamento superlativo

Despertando grande curiosidade na chegada ao mercado nacional, a Voge 900DSX mostra-se completamente imune à ‘síndrome do chinês’, com nível de equipamentos e acabamentos capaz de igualar e mesmo superar grande número de máquinas europeias e japonesas.

Afinal basta atentar na lista de equipamento para perceber o posicionamento desta máquina, dotada de banalidades como a iluminação full LED, o painel TFT de 7 polegadas com conetividade ou o para-brisas ajustável. Mas que conta também, de série, com amortecedor de direção, ‘quick-shifter’, sistema ‘keyless’, manetes ajustáveis, descanso central ou a prática informação da pressão e temperatura dos pneus (TPMS). No entanto, a Voge 900DSX não fica por aqui no que diz respeito à qualidade! E conta com assinaturas de renome nos capítulos do amortecimento (Kayaba), travagem (Brembo), eletrónica (Bosch) ou pneumáticos (Pirelli). Já no departamento dos acessórios opcionais apenas o conjunto de malas em alumínio ‘by Loboo’, com 28, 36 e 35 litros de capacidade, respetivamente da direita para a esquerda. E que, contando com aveludado forro extraível e sistema de fecho com segurança dupla, custam apenas 898 € na fase de lançamento.

Mas, afinal, qual era a expetativa depois de ter visto a Voge 900DSX em vários salões e analisado (no papel) todo o potencial técnico? Era exatamente igual a uma moto de qualquer outra origem com características semelhantes. Ou seja, o ‘local de nascimento’ inscrito na certidão pouco peso teria na análise sendo mais relevante, isso sim, o preço anunciado.

Negócio da China?

Mas será a Voge 900DSX um bom negócio apenas graças ao baixo valor de venda ao público? A resposta só pode ser negativa. O PVP extremamente competitivo, de 8888 euros nesta fase, revela um verdadeiro negócio da China ao confirmar, na estrada, todos os atributos anunciados no papel. Estatuto validado ao longo de mais de 2000 quilómetros que incluíram a ligação de Portimão a Penafiel, com passagem por Évora e Covilhã. No percurso do 26.º Portugal de Lés-a-Lés, mais as viagens para a partida e desde a chegada, pudemos perceber o funcionamento de todos os parâmetros.

Voge 900DSX

Comecemos pela posição de condução. Afinal a primeira impressão que ressalta no contacto com qualquer moto. Para lá da estética, que aqui deixamos ao critério de cada um. O assento, a 825 mm do solo, é estreito na zona dianteira, permitindo um bom apoio dos pés no solo, vantagem inegável quando falamos de um peso (a seco) na ordem dos 215 kg. O conforto é bem superior ao expetável numa trail desta categoria, permitindo tiradas de 500 km sem fadiga excessiva.

Voge 900DSX

Além de ser ponto de partida para uma posição agradável, com as pernas não demasiado dobradas. Pelo menos para quem, como eu, tem uma altura de 1,72 m. Único senão, a configuração e, sobretudo, o posicionamento do guiador, baixo e obrigando a levar os braços mais distendidos que o desejável. E em fora-de-estrada bem falta fazem mais uns centímetros de altura para uma eficaz condução em pé. Condução mais aventureira que beneficia de uma largura reduzida na zona dos joelhos, bem como dos poisa-pés largos e serrilhados. Isto depois de serem desprovidos das borrachas utilizadas para maior conforto em estrada. Os pés ganham em estabilidade e a utilização dos bem ajustados pedais é ainda mais fácil.

Posto de comando simples e prático

Bem sentado no posto de comando, o condutor pode ajustar manualmente o ecrã em duas posições e tem acesso a comandos de linhas simples e guiados pelo sentido prático. A proteção é razoável para condutores até 175 cm de altura. Mas os mais altos ou mais turísticos deverão optar por um ecrã de maiores dimensões. Bem melhor a proteção aos punhos e antebraços, graças aos protetores de mãos, e às pernas, por força do formato alargado do depósito.

Voge 900DSX

Voge 900DSX

Voge 900DSX

Voge 900DSX

Voge 900DSX

Botões de bom toque, com colocação e acionamento intuitivo, nomeadamente o interruptor dos piscas, super suave e que pode ser desligado com segundo clique na direção em que está ligado. Pena, no entanto, que apenas os quatro botões que comandam as funções do painel sejam retro iluminados…

Voge 900DSX

Igualmente o painel TFT, de 7 polegadas de diagonal, tem um design sóbrio e menu de boa ergonomia. É fácil compreender a lista de funções e aceder a cada uma delas, perdendo apenas pelo facto de ter apenas um conta quilómetros parcial e de não ser prático colocar a zeros. Algo que faz falta, sobretudo no Lés-a-Lés ou eventos onde seja importante controlar a quilometragem enquanto, ao mesmo tempo, queremos saber quantos quilómetros fizemos desde o último reabastecimento. O que ganha particular importância porquanto o bem legível nível de combustível tem um funcionamento que exige alguma habituação, desligando os segmentos de forma nem sempre lógica. Ora, sabendo que com os 17 litros que o depósito transporta é possível fazer cerca de 300 quilómetros é mais fácil evitar ficar parado na estrada com uma ‘panne seca’.

Voge 900DSX

Voge 900DSX

Voge 900DSX

Eletrónica para que te quero

Painel que oferece boa leitura de todas as informações sobre o veículo e em todas as condições, bem como a temperatura exterior ou as horas. E que pode ser conectado ao telemóvel, para, com recurso à aplicação da marca controlar o universo. Fazer e receber chamadas, ouvir música e navegar através do GPS são algumas das funções.

Mas é também através do painel que é possível escolher um dos 4 modos de condução mediante pressão no botão localizado junto ao punho direito. Mudança que apenas pode ser feita com a moto parada – algo que deverá ser alterado na próxima versão – bastando um toque para optar pelo Rain, Road ou Sport. Já para ligar o modo Enduro, que desativa o controlo de tração e ABS nas duas rodas, é preciso pressionar mais alguns segundos, como forma de segurança acrescida.

Como seria de esperar, a mais equilibrada das configurações na Voge 900DSX é a Road, com entrega mais suave e linear em todas as rotações. Nota-se alguma hesitação, normal, abaixo das 2500 rpm para, assim que a agulha passa as 3000 rpm revelar um funcionamento muito uniforme, com boas acelerações e recuperações. A faixa ideal de funcionamento está entre as 3000 e as 6000 rpm, altura a partir da qual uma ligeira vibração. Que é sentida essencialmente nos poisa-pés e recorda que estamos um pouco para lá da velocidade máxima legalmente permitida em Portugal. No entanto – algo que não aconselhamos a comprovar em estrada… – o velocímetro pode marcar velocidades bem superiores a 200 km/h. Como a que registamos na pista de um aeródromo privado algures no Alentejo.

Calor que se agradece… no inverno

O mais incrível é que, a essa velocidade e com as três malas montadas, a frente praticamente não abana, garantindo grande estabilidade graças ao amortecedor de direção montado de série. Ahh… e as duas voltas no controlo remoto de pré-carga do amortecedor traseiro, de fácil acesso e manuseamento, também ajudam a dianteira a manter a compostura.

Voge 900DSX

Voge 900DSX

Voge 900DSX

Voge 900DSX

Continuando a analisar a unidade motriz, sublinhe-se a tendência a libertar bastante calor. O que, sendo desconfortável no verão, foi agradecido na madrugadora passagem pelos caminhos da serra da Estrela. Bloco que serve de elemento portante em ciclística rígida e que é praticamente isento de vibrações.

Mais agressivo no modo Sport, revelou, porém, maior facilidade e precisão na utilização do ‘quick-shifter’ ainda que o acelerador seja mais nervoso. Com um de temperamento, mais ‘on-off’ dando a impressão de algumas irregularidades na injeção eletrónica. Por falar nisso, diga-se em abono da verdade que, nos modos restantes, e em ritmos mais comedidos, o melhor mesmo é utilizar a embraiagem. Não é um exemplo de suavidade absoluta, mas a verdade é que a bem escalonada e precisa caixa de velocidades revela-se muito mais macia.

Aventuras com limites

Para os mais aventureiros existe o modo Enduro que, tal como todos os outros, só liga com a moto parada. E mostrou mais agressividade na resposta ao acelerador além de desligar o ABS nas duas rodas e o controlo de tração. Na passagem pela serra da Estrela, para fugir às obras da conhecida estrada do Vale Glaciar (N338), um belíssimo e largo estradão ajudou a descobrir o enorme potencial de diversão desta moto, embora limitada pelos pneus Pirelli Scorpion Trail II de perfil estradista. Que, no seu habitat natural, mostraram facilidade em estrada seca, eficácia a curvar e confiança em piso molhado.

Pneu de 21” na dianteira, pensado para utilização em ‘off-road’ mas que exige alguma habituação nas trajetórias. Naturalmente mais largas, mas que, em contrapartida, permite maior inclinação que uma borracha mais apta a utilização em TT.

Já no modo Rain, de potência ligeiramente reduzida, a entrega é deveras suave, quase excessiva nas mais baixas rotações. Por isso, neste caso, deve limitar-se a uma utilização exclusiva em condições de aderência precárias. Porque mesmo aqueles que gostam de maior suavidade na condução urbana, poderão achar este modo excessivamente pacífico.

Voge 900DSX

Voge 900DSX

Voge 900DSX

Voge 900DSX

Voge 900DSX

Já quanto ao amortecimento, com elementos desenvolvidos em conjunto com a Kayaba, revelou uma afinação original algo dura. A forquilha tem bainhas de 43 mm de diâmetro e um curso de 194 mm e apresenta algumas irregularidades da parte inicial do curso. Um tato algo seco que, reduzindo à compressão e aumentando a velocidade de recuperação, ficou mais agradável. Melhor na terra como nas passagens pelo empedrado de algumas aldeias e vilas da zona raiana, sem perder na eficácia nas curvas mais rápidas e em apoio.

Mais importante que o preço baixo…

Atrás, os dois ‘clicks’ na pré-carga do amortecedor traseiro para limitar os efeitos da carga aerodinâmica nas malas reduziram a sensação de uma frente demasiado leve. É verdade que estas mudanças também modificaram a sensação em travagem, com um movimento mais percetível no início da desaceleração. Após um momento inicial em que é sensível um toque esponjoso, os dois pistões das pinças Brembo mordem com vontade os discos de 305 mm. Uma fase inicial com alguma falta de mordacidade, que acaba por contribuir para maior facilidade em terra e pisos molhados. E que, logo depois, revela muita potência e uma excelente progressividade ajudada pela bomba radial.

Voge 900DSX

Na traseira, o disco de 265 mm ajuda nos ajustes de último momento em curva, mostrando-se perfeito para corrigir trajetórias e reduzir a velocidade, minimizando potenciais efeitos dos excessos de confiança. Tanto mais que a roda dianteira de 21” obriga a cuidados acrescidos devido à natural tendência para alargar um pouco as trajetórias. O mesmo se passa nos pisos de terra, desligando o ABS, contribuindo para colocar a traseira em derrapagem, facilitando a entrada nas curvas mais apertadas. Situação em que se nota a ausência de pneus adequados à prática da modalidade.

Voge 900DSX

Posto isto, voltamos à questão inicial da Voge 900DSX que, apesar de já estar à venda em Portugal não será fácil comprar, tamanha é a procura. Será esta uma moto destinada a brilhar por ser barata? Por ter um PVP que é pouco mais de metade face a alguma concorrência? Sinceramente penso que essa é uma abordagem errada! Na verdade esta Voge 900DSX tem um bom preço, é certo, mas tem, acima de tudo, uma imbatível relação qualidade/preço. E esse é um fator a levar em linha de conta na hora da opção…

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