Virar tudo de pernas para o ar !

  • Texto: Fernando Pedrinho
  • Imagens: Yamaha Racing, WorldSBK

A Yamaha já viveu momentos altos no Mundial de Superbike com o título de pilotos conquistado por Ben Spies, em 2009, e o de construtores, dois anos antes. Mas sabe a pouco face ao potencial que a YZF R1 tem vindo a apresentar nos últimos anos e que a contratação do rei das travagens, Toprak Razgatioglu, ou até mesmo da sensação do ano passado, o texano Garrett Gerloff, vieram confirmar.

Para 2021 a Pata Yamaha WorldSBK, agora associada à Brixx, uma empresa de modelação digital para a área financeira e empresarial, conta com uma nova R1 e que está melhor que nunca a julgar pela rapidez demonstrada nestes últimos cinco meses. Será desta que termina o jejum?

A Yamaha trabalhou muito no equilíbrio geral da moto e das sensações que transmite ao piloto. Com destaque para a a travagem – desde o novo conjunto Brembo, para dias mais quentes, ao travão-motor – e a aerodinâmica. Este último um dos pontos mais debaixo de olho já que Garrett Gerloff, por exemplo, confirmou que a moto está uma verdadeira ‘arma’, mas que a velocidade em reta é ainda um dos raros pontos que gostaria de ver melhorado.

A YZF R1 de 2021 é uma séria candidata ao reencontro com os títulos mundiais, algo só alcançado pela marca dos três diapasões em 2007 (construtores) e 2009, de pilotos através de Ben Spies.

A alteração mais evidente reside nas extensões para diante que ladeiam a abertura central do frontal da R1. Lateralmente, e num plano inferior, mantêm-se os entalhes laterais que dão lugar à geração de umas ‘micro-aletas’ que se estendem longitudinalmente. Por outro lado, há agora um plano inferior que não se via na versão anterior, sob as quais aparecem as falsas ‘bochechas’ de encastramento dos faróis. A agressividade é tal que de imediato nos vem à memória a máscara de ‘Batman’.

O diretor técnico da moto do piloto turco, o irlandês Phil Marron, confirmou que “os benefícios situam-se ao nível da melhor proteção aerodinâmica conferida ao piloto e, marginalmente, em termos de velocidade máxima”.

A Yamaha não mostra totalmente o jogo sobre os reais benefícios em termos de velocidade de ponta, até porque estes melhoramentos chegaram do Japão, onde há muito trabalho desenvolvido em túnel de vento para as MotoGP, tendo mesmo sido efetuados testes de simulação de corrida, conforme nos revelou Andrea Dosoli. Contudo, a radical modificação da secção traseira, que também anda muito ‘escondida’ das fotos, é reveladora da busca que a marca dos três diapasões tem feito para aumentar a eficácia aerodinâmica da R1.

Reparem na carenagem inspirada na projeção cefálica de uma jamanta, que rodeia a ‘boca’, assim como a pequeníssima aleta que surge lateralmente. A ‘bochecha’ inferior corresponde ao nicho de encastramento de um dos faróis dianteiros. Há também algum efeito de ‘anti-lift’ e é esperado um melhor comportamento aerodinâmico quando se segue atrás de outro piloto.

A oficial Pata Yamaha WSBK testou três versões desde Jerez de la Frontera: a versão de 2020, um híbrido baseado na moto deste ano e a proposta para 2021. A versão 2021 “tem um quadro com diferentes reforços para ajustar a rigidez e melhorar a capacidade de fazer girar a moto sob o efeito de uma forte travagem”, confirmou-me Phil Marron.

Toprak viu-se a braços, durante a época 2020, com notórios problemas de tração quando liderava algumas das corridas longas de Domingo, e a equipa trabalhou muito nessa área. Mantém-se o novo braço oscilante estreado este ano, depois de ter provado ser uma melhoria neste campo e a “eletrónica dá uma sensação bastante melhor”, disse-nos Toprak. Mas as esperadas temperaturas mais elevadas no Motorland Aragon, com o Verão à porta, permitirão tirar mais conclusões sobre a consistência do comportamento do pneu ao longo da corrida.

Como sucedeu com todas as restantes equipas, a experimentação de diferentes braços oscilantes foi uma constante nas duas principais equipas da Yamaha.

O turco de Alanya é conhecido no ‘paddock’ como ‘STOPrak’, e reconhecido pelos seus adversários como o demónio das travagens tardias, pelo que Marron e a equipa trabalharam bastante em torno da nova pinça dianteira da Brembo. “O Toprak é muito agressivo nas travagens o que leva a que a pinça exceda os limites de temperatura definidos. A nova unidade funcionou muito bem e conseguimos baixar em mais 10% os valores de trabalho do novo material”, confirmou o irlandês. “Combinadas com a eletrónica que desenvolvemos para este teste, tendo em vista reduzir a inércia do motor, conseguimos melhorar a travagem da moto na fase final desta manobra”, acrescentou. Essencialmente, os muitos acelerómetros espalhados pela YZF R1 destinavam-se a compreender de que forma o pneu traseiro impulsiona a moto para diante, fazendo derrapar o pneu dianteiro sobre o asfalto. De igual modo, os discos das R1 oficiais tinham uma tinta ativada termicamente. Ou seja, o aparecimento de cada cor implicava que o disco atingisse a temperatura de ativação específica de cada uma delas, o que permitia entender as temperaturas atingidas pelos discos em travagem.

A nova pinça refrigerada da Brembo será seguramente uma vantagem para ‘Stoprak’ Razgatioglu nos circuitos com travagens mais exigentes e disputados em dias de maior calor.
Nas sessões de teste as motos surgem equipadas com sensores por toda a parte. Este acima, fixo à base da manete, permite medir quer o curso quer a pressão aplicada na travagem.

Do outro lado da garagem, o antigo campeão mundial de Supersport, Andrew Pitt, é agora o responsável técnico pela moto do atual detentor do título dessa categoria, Andrea Locatelli, que se viu promovido à equipa oficial, substituindo Michael van der Mark, que rumou à BMW Motorrad. ‘Loca’ rodou 160 voltas em Jerez e concentrou-se no mapeamento do motor, para adaptar o quatro cilindros o mais possível ao seu estilo de condução, muito mais fluido e inspirado na ‘escola’ Moto2, relativamente ao seu companheiro de box.

Vista do espetacular escape 4-2-1 realizado integralmente em titânio para as R1 oficiais.
Um dos técnicos da Yamaha de volta das novas pinças Brembo dianteiras. As suspensões continuam a ser fornecidas pela Öhlins.

Presença assídua na área da GRT Junior Yamaha, o homem forte da marca de Iwata, Andrea Dosoli, assumia a curiosidade para ver o que a estrela texana em ascensão, Garrett Gerloff, conseguia nestes testes, ao lado do japonês que parece ter saído de uma banda desenhada ‘manga’, Kohta Nozane, e que tem o estilo de pilotagem mais bonito de toda a grelha. Concentrados num teste de comparação entre a moto de 2020 e 2021, o sempre sorridente e afável Gerloff confirmou que há que contar com a versão de 2021 para as vitórias. “A moto melhorou muito na tração em curva, o motor está muito forte e a tendência para levantar a frente em aceleração também está mais controlada”, dizia o descendente de imigrantes alemães. Garrett comparou a versão de 2020 com os ‘settings’ de Toprak e Van der Mark em termos de comportamento da ciclística e motor. Mas depois concentrou-se na moto 2021, que “dá mais confiança na frente e mais tração na traseira. Mas agora há que trabalhar nos detalhes”. A moto com que foi para o Motorland, para a primeira corrida da temporada, é uma ‘full spec’ 2021 idêntica em tudo à das azuis e vermelhas da Pata Yamaha by Brixx de Toprak e Locatelli.

Acelerómetros por toda a parte para ajudar a calibrar o travão motor. Aqui um dos montados na frente…
... e outro no braço oscilante
As proteções de órgãos vitais do motor são fundamentais para a integridade do mesmo em caso de queda, obviamente dentro dos limites que as leis da física permitem. Aqui podemos ver as proteções fornecidas pela GB Racing para a embraiagem, uma unidade da Sutter, e da bomba de água.
Toprak utiliza a manete de ‘scooter’ – visível ao meio, entre o punho e a manete de embraiagem.
Aqui noutra perspetiva.
Já Locatelli opta pela manete de polegar,
Vista deste ângulo é mais fácil de entender o seu posicionamento
O pequeno entalhe na extremidade da alavanca de travão serve para facilitar o fluxo de ar através da manete, evitando assim que a alta velocidade esta atue as pinças do travão dianteiro, travando a moto nas retas mais longas, como a de Alcañiz (Motorland), diminuindo a velocidade máxima e gerando calor desnecessário. Um pequeno detalhe, mas importante.
A moto de Locatelli surgiu com esta proteção especial junto ao poisa-pé direito…
… enquanto Toprak optou pelo formato mais convencional
A principal razão prende-se com esta proteção e espaçador montado na bota do italiano.
Mosaico de fotos da preparação dos pneus. Em cima e à direita, a linha branca ajuda a perceber se o pneu rodou no aro e, em baixo, a marca verde serve para colocar em destaque o código do pneu, para permitir aos mecânicos possam confirmar o tipo e modelo na hora da montagem
Terminada a carreira desportiva na Honda, Cal Crutchlow, à esquerda, é agora piloto de ensaios da Yamaha MotoGP mas não renega as origens e esteve em Aragão para dar algumas sugestões a Andrea Locatelli, ao centro, sobre a posição de pilotagem. Andrew Pitt, à direita, ‘fabricou’ mesmo um ‘postiço’ que foi colocado sobre o assento da moto do seu pupilo.
O estreante Kohta Nozane, que faz equipa com Garrett Gerloff na GRT Yamaha, é já o favorito dos fotógrafos devido à espetacularidade do seu estilo de pilotagem.
Na ausência de Toprak, vítima assintomática de Covid-19, Niccoló Canepa – piloto oficial da YART no Mundial de Resistência, deu uma ajudinha a Phill Marron, o ‘crew chief’ do piloto turco e que já passou pelas fileiras da Parkalgar.
Razgatioglu e Locatelli comparando notas sob a supervisão de Andrew Pitt, ex-campeão mundial de Supersport e ex-piloto de Superbike.

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