Antes do périplo do Mundial de MotoGP pela Ásia e Oceânia, MotoX.pt foi ao GP de Aragão falar com Razlan Razali. O próximo ‘patrão’ de Miguel Oliveira elogiou o piloto e o homem e não escondeu grandes expetativas para 2023. Mas disse mais e até confessou que… não vai ser ele a pagar o ordenado ao português!
- Texto: Paulo Ribeiro
- Fotos: RNF MotoGP Team e KTM Racing Team
Extremamente simpático e bom comunicador, Razlan Razali é o homem forte da RNF MotoGP Team. A formação que tem o nome de família e dos filhos (Razali, Nadia, Farouk), e que contará, em 2023, com Miguel Oliveira nos seus quadros. O malaio é profundo admirador das capacidades do piloto português e, quando a oportunidade surgiu, não a desperdiçou.
“Ao olhar para o que fez em Moto2, também para o background em Moto3 e para o que tem feito com a KTM, achamos que conseguimos extrair muito mais potencial dele, na nossa equipa, especialmente com a Aprilia”. E, mesmo sendo certo que, inesperadamente, a lista de potenciais candidatos cresceu bastante, Razali não teve grandes dúvidas. “Por causa da situação com a Suzuki, existiam muito mais opções. Havia uma lista de pilotos muito bons e o mercado este ano é muito diferente quando comparado com o ano passado. O Miguel Oliveira acabou por uma coincidência, porque vi o Paulo (Oliveira) a passar no paddock e como apreciava o Miguel desde que ele estava em Moto2, fui falar com ele e disse-lhe: “Paulo, posso falar com ele (Miguel)?” Acabamos por reunir com Massimo Rivola (diretor-executivo da Aprilia Racing), e explicamos o projeto”.
A fotografia e a confirmação ‘dada’ por Ciabatti
Só que, nessa altura, o futuro de #MO88 ainda estava em fase de conversações. “O Paulo estava em negociações com a Ducati (isto foi em Silverstone, no dia daquela famosa fotografia com Paolo Ciabatti na Gresini Racing) e, apesar de não o conhecer pessoalmente, fui falar com ele. Mais tarde, nessa mesma noite, o Miguel foi ter connosco e ouviu os nossos planos. Especialmente da Aprilia, que explicou o projeto e ele ficou imediatamente entusiasmado”. Situação que o diretor desportivo da Ducati Corse ‘esclareceu’ de imediato dizendo que a Ducati e o Gresini Team tinham demorado demasiado tempo a oferecer um contrato e, por isso, Oliveira terá aceite a proposta da Aprilia
Uma jogada de sorte que ajudou a cumprir o desejo de ter o português na RNF MotoGP Team. “Sempre vi com bons olhos a ida do Miguel Oliveira para a equipa e tomei a iniciativa de o fazer. Até porque também tínhamos ouvido que ele não estava contente por ser ‘despromovido’ para a Tech3, o que também não me parece que fosse o mais correto… E por isso tínhamos de tentar, ainda que abordar os pilotos KTM fosse complicado por que não podíamos ir falar diretamente com eles. Por isso, quando ouvimos o que se passava e nos asseguramos da situação, então sentámo-nos para falar”.
Um processo que acabou por ser “razoavelmente fácil, ainda que difícil de concretizar por causa de todos os acordos e cláusulas do contrato com a KTM. Foi necessário sermos muito pacientes e o Miguel teve de ser muito claro em relação à sua posição”.
Mas tudo acabou em bem, sem mal-entendidos, “permitindo-nos fazer o anúncio, o que acabou por acontecer em Misano. O que para nós foi um excelente timing, por ser em Itália e logo perto de Noale”, coração industrial da Aprilia.
Para brilhar já em 2023
Com a conclusão do processo de contratação, com duração de dois anos e a possibilidade de prorrogação por igual período, já se pensa no futuro dentro da equipa malaia. O ex-CEO do Circuito Internacional de Sepang (de 2008 a 2020) não esconde a grande ambição: “O que esperamos do Miguel? Resultados imediatos! Sabemos que a mota é boa, foi por isso que mudamos da Yamaha para a Aprilia. Mas isso não têm de me perguntar a mim. Perguntem ao Miguel, quando ele está a andar atrás de uma Aprilia, como a vê”.
Um feedback que, naturalmente, já recebeu, e que ajuda a justificar que “o Miguel está ansioso por testar a moto em Valência, após o último Grande Prémio do Mundial de MotoGP 2022. Aliás, todos estamos muito entusiasmados. Pelos novos pilotos e pela estreia na equipa da (Aprilia) RS-GP. E estão todos muito curiosos porque, até agora, só o Aleix (Espargaró) tem desenvolvido e pilotado aquela mota ao longo destes últimos (muitos…) anos. Depois temos o Maverick (Viñales) que veio para a e equipa e, uau, olhem para ele. Esteve na Suzuki, na Yamaha e, desde que veio para a Aprilia, já conseguiu subir ao pódio. Por isso, estão todos muito curiosos e ansiosos por começar a testar”, sublinhou o homem que fez de Hafizh Syarhrin o primeiro malaio em MotoGP (2018, na Tech3).
A Aprilia pede condução mais solta
Nesta equação, nota para uma incógnita que pode, afinal, ser conhecida: A capacidade de adaptação de Oliveira ao estilo de pilotagem da Aprilia. É que o português tem uma ‘escola’ de condução com bastantes similaridades com Viñales. Opinião partilhada por Razali, que reforça a esperança de ver Miguel encaixar bem na RS-GP de 2022. “Esperemos que estes anos na KTM não o tenham restringido a pilotar de uma forma mais solta a Aprilia. Acho que vai ser mais fácil até porque a Aprilia é aquilo que definimos como uma mota híbrida, entre um V4 e a Yamaha. Transitar para um motor com características semelhantes ao da KTM (V4) não vai ser muito diferente, terá mais a ver com o ‘handling’ da mota, que, esse sim, é bastante diferente daquilo a que ele está habituado”.
Para o ajudar na adaptação à nova montada, Miguel Oliveira terá ao seu dispor “mecânicos muito experientes, oriundos da equipa de fábrica, além de alguns mecânicos que estão na equipa desde 2019 e que trabalharam com Franco Morbidelli, Andrea Dovizioso ou Cal Crutchlow. A Aprilia vai disponibilizar um excelente chefe de equipa, um bom mecânico e um bom engenheiro de motores.
Pilotos experimentados, com enorme rapidez confirmada em títulos mundiais (125 cc em 2004 para Dovizioso; Moto2 em 2017 para Morbidelli) e vitórias em MotoGP (15 e 3 respetivamente). E que partilham com Miguel Oliveira uma cordialidade pouco vista no paddock do Campeonato do Mundo.
“Miguel está motivado para ganhar”
Razlan Razali confirma, com largo sorriso, a simpatia dos italianos, para logo deixar bem claro “não estar à procura de um piloto simpático. Procuro um piloto que esteja muito motivado para ganhar e esse piloto é o Miguel. Ele podia facilmente mudar de ideias e aceitar uma oferta maluca de Gas Gas pelo dinheiro. Ele quer mostrar o seu potencial e quer ganhar. Todos querem ganhar”.
Sim, mas quer ganhar mais do que apenas dinheiro. “O desejo, a motivação para ganhar é ainda muito forte por parte do Miguel e isso é muito importante”.
Motivação desportiva que parece ter ultrapassado a aliciante proposta feita pela Gas Gas face à da RNF MotoGP Team? Razali dispara com um tom que ainda não conhecíamos. “Não, não, não! A proposta é da Aprilia! Foi feita pela Aprilia e o Miguel será piloto oficial da Aprilia. Mas sim, do que sabemos, a proposta da Aprilia não terá sido tão alta, em termos financeiros, como a da Gas Gas”.
A decisão de Oliveira vestir a camisola da marca de Noale assenta assim na vontade de ganhar e na confiança que os triunfos podem acontecer rapidamente. Diz Razali: “Acho que acredita no projeto, acredita no que a Aprilia tem feito e no que pode fazer na próxima época. Bem como no que pode fazer por ele. Ele acredita que a Aprilia pode dar-lhe a capacidade de ganhar e muito rapidamente. Aos 27 anos a próxima época será aquela em que ele tem de ir à luta”.
“A última oportunidade? Ainda tem muito para dar…”
A falar desta forma poder-se-ia depreender que será a última oportunidade de afirmação em MotoGP e de ganhar corridas e até o título? “Para o Miguel? Não! Neste desporto há uma série de jovens pilotos, cada vez mais rápidos, mas o Miguel ainda está no topo. Por isso, acho que se ele conseguir combinar tudo muito bem e se estiver confortável com a mota e tudo o resto, ele ainda consegue ser muito competitivo nos próximos 2 a 4 anos”.
“Além de que é um piloto muito inteligente, talvez mesmo um dos pilotos mais inteligentes da atualidade, com bastante sensibilidade para entender as reações de uma moto. E sobretudo com a capacidade de explicá-las muito bem. Consegue descrever de forma muito detalhada toda a experiência de condução. É, definitivamente, um tipo muito inteligente”.
Entradas de pilotos; saídas de patrocinadores
Do outro lado da box estará Raul Fernandez, vice-campeão mundial de Moto2 logo na época de estreia, em 2021, título que valeu bilhete de entrada em MotoGP. Mas a ‘porta’ KTM/Tech3 nem chegou a fechar para deixar sair o jovem madrileno de 21 anos após um ano em que apenas chegou aos lugares pontuáveis em três ocasiões.
“O Raul é outro piloto que admiro desde o início. Queríamo-lo para este ano, já desde o ano passado. O que ele fez como ‘rookie’ em Moto2 foi fantástico. É bastante jovem e tem um potencial enorme. Não está contente e por isso queremos dar-lhe uma estrutura que todos os pilotos precisam de ter, para poder voltar a ser feliz. O mesmo se passa com o Miguel. Todos querem estar felizes e a correr. Basta ver o caso do Fabio (Quartararo). Porque tem uma performance tão boa? Ok, ele tem talento, mas está rodeado das mesmas pessoas desde 2019. E isso é realmente muito importante”.
Mas se entram novos pilotos, parece que regressam as dificuldades de patrocinadores com a saída da WithU, o ‘main sponsor’ da RNF. Uma situação que trouxe à memória a partida da Petronas…
Agora, o fornecedor de gás, eletricidade, Internet, telefone fixo e móvel, nascido em junho 2019 parece ter mudado repentinamente de ideias. A holding Europe Energy S.p.A Group de Matteo Ballarin, que integra a WithU, poderá deixar o Mundial de MotoGP (e de MotoE) onde está presente desde 2017 com a MarcVdS, SRT Petronas e RNF Team. Para a concorrente de empresas gigantescas como a ENEL ou AGSM, as atenções ficam concentradas no futebol (A.C. Monza da Série A) e no voleibol (Verona Volley).
“Patrocinadores portugueses? Porque não…”
Um anúncio que colheu de surpresa Razlan Razali que, no entanto, garante que “existe um acordo assinado até 2024. Portanto, até noticias em contrário, eles continuam a ser o nosso patrocinador principal, garantindo cerca de 50% do orçamento anual”.
Um patrocinador italiano que anuncia que vai deixar a equipa depois do abandono de um piloto italiano (Dovizioso) não será demasiada coincidência? “Hummm, não seria por não ter pilotos italianos, até porque agora existe uma moto italiana, a Aprilia… Mas ainda estamos a tentar compreender o que é que eles estão a pensar em termos de patrocínio. Neste momento ainda nada está definido, embora esteja perfeitamente claro, para nós, que existe um acordo válido até 2024. Um patrocinador não pode acordar um dia e dizer “Ah, eu quero sair do MotoGP e ir jogar voleibol”.
Indecisão que pode gerar novas oportunidades. Inclusive a de ver uma marca portuguesa nas carenagens das Aprilia RS-GP em 2023. “Sem falar de dinheiro – até porque esta é uma situação que não está em cima da mesa neste momento – os valores são normalmente consensuais”. Mas nenhuma hipótese é de descartar “até porque foi-me dito que o Miguel é o segundo atleta mais popular em Portugal. Estamos sempre abertos a todos os patrocinadores portugueses, especialmente quando temos um piloto português. Acho mesmo que esta pode ser a altura para as empresas portuguesas se chegarem à frente, para patrocinar o ‘seu piloto’ e estarem associados a ele. É uma oportunidade perfeita!”