Aposta fortíssima no segmento mais representativo no mercado nacional, a QJ Motor SRT700X é mais uma proposta de peso entre as trail estradistas de média cilindrada. E com um comportamento dinâmico capaz de envergonhar máquinas de outra dimensão… económica. Fomos descobri-la no coração da Catalunha, com os Pirinéus como pano de fundo, e aproveitamos para andar em alguns caminhos de terra. Onde esta trail com roda de 19 polegadas à frente e pneus longe do aconselhado para aventuras destas, surpreendeu pela eficácia.
- Texto: Paulo Ribeiro
- Fotos: Roger Rovira
O paradigma chinês continua a mudar a cada modelo apresentado pelas mais diversas marcas. A capacidade evolutiva fica bem patente a cada nova versão e aproxima-se, de forma paulatina, das propostas de outras proveniências. Quiçá de maior reputação e que, por isso mesmo, obrigam a olhar de maneira meticulosa para cada novo modelo, numa análise de exigência dobrada. Sem nome sonantes como Honda ou Yamaha, BMW ou Triumph, Aprilia ou Ducati, as marcas chinesas são forçadas a trabalhos dobrados para conquistar a sua quota de mercado. Que a questão do preço não resolve, ‘de per si’, todas as dúvidas ainda reinantes.
Também os jornalistas são cada vez mais exigentes na análise de novos modelos como a QJ Motor SRT700X, não dando concessões numa análise comparativa direta. As questões são levantadas e a valoração efetuada como se fosse modelo japonês ou europeu. É que longe vai o tempo das máquinas chinesas ao preço da ‘uva mijona’… Cujos problemas técnicos, de eficácia e fiabilidade, eram ‘desculpados’ pelo fator preço.
Um novo mundo sobre rodas
Com a chegada, assumida e despudorada, dos fabricantes chineses, apostando nas próprias marcas, começou uma nova revolução no mercado mundial. E se há quem a compare ao sucedido com as marcas japonesas nas décadas de 1960 e ’70, contestando a hegemonia das casas britânicas, a verdade é que a História apresenta muitas diferenças. Desde logo, e de forma óbvia, pela diferença dos tempos. A globalização, a rapidez de comunicação e a evolução tecnológica, esteve na base da emancipação das enormes fábricas chinesas. Que, rapidamente, descobriram as vantagens de utilizar o ‘know-how’ adquirido ao longo de décadas a fabricar para os europeus e japoneses. E se, alguns, optaram pela aquisição de símbolos históricos da indústria do Velho Continente, são cada vez mais os que avançam, sem receios, com nomes próprios.
A QJ Motor oferece um excelente exemplo sendo uma das mais recentes a iniciar a operação no mercado nacional. Em meio ano disponibilizou oito modelos e mais algumas versões diferenciadas. E não teve qualquer problema em lançar a QJ Motor SRT700X numa categoria onde poderia mesmo canibalizar a SRT800X. Paulo Sérgio Anjos garante que “esta é a melhor forma de perceber claramente as orientações do mercado. E de oferecer ao cliente a possibilidade de opção entre duas máquinas que, apesar de serem parecidas, têm muitos pontos de diferença”.
Para o responsável máximo da MB Motor Portugal, distribuidor nacional da marca, “esta política visa dar um maior leque de escolhas. O que, além das inegáveis vantagens para os motociclistas, ajudará a perceber melhor quais as diretrizes a seguir a médio prazo em termos de gama”.
Lutar (com a ‘irmã’…) por um lugar ao sol
Política em que encaixa perfeitamente o lançamento da QJ Motor SRT700X. Pronta para esgrimir argumentos no segmento de ‘motos grandes’ mais importante do mercado em Portugal. Responsável por mais de 18% do total de vendas em 2022. Máquina de linhas bem europeizadas, com dimensões e performances que parecem encaixar na perfeição nos desejos dos motociclistas lusitanos. A começar por uma estética agradável e consensual, com iluminação ‘full LED’ e um bico-de-pato que parece ser fundamental para levar qualquer novo modelo ao sucesso. E que vai até ao elevado nível de componentes e bons acabamentos. Mesmo se alguns pormenores, como os pedais de travão ou o seletor, pudessem apresentar outras características.
Comecemos pelo posto de condução, dotado de comandos simples, mas, sublinhe-se, retro iluminados, bem distribuídos ergonomicamente, e acompanhados por painel TFT de 5 polegadas. O tamanho é suficiente para proporcionar boa legibilidade. Mesmo se a distribuição das informações e o tamanho dos carateres merece ser otimizada. Com duas opções de visualização e conetividade através de Bluetooth, tem tudo o que é necessário para controlar a moto e as viagens. Incluindo a pré-instalação do sistema de monitorização da pressão dos pneus TPMS.
Boa vida a bordo
Painel que está colocado em posição quase vertical, entre um guiador sem largura exagerada e com os punhos voltados para dentro e uma aranha em tubos de aço. Que além de suportar o painel e o ecrã frontal, oferece local de eleição para fixar o GPS ou o suporte de telemóvel. Beneficiando ainda da boa posição da tomada USB bem implantada no tablier. Simplicidade e sentido prático em máquina que conta com manetes reguláveis em quatro posições, punhos e banco (!!!) aquecidos e proteções de punhos de série em alumínio e plástico. Que, além da defesa em caso de frio ou chuva, são mais eficazes em caso de queda ou na prática do todo-o-terreno. Também o ecrã frontal, tal como as proteções logo abaixo, garantem boa eficácia, ainda que não seja ajustável em altura.
Equipamento de bom tato que contribui para a boa vida a bordo. O banco, a uma altura de 825 mm, é acessível apesar de não ser propriamente baixo, sensação de altura reforçada pela largura na zona de união com o depósito. As pernas não ficam particularmente dobradas, mas os poisa-pés numa posição elevada e adiantada ajudam o condutor a sentar-se de forma cómoda, com as costas direitas, favorecendo ainda a condução em pé. E com o guiador razoavelmente estreito e com os punhos ligeiramente voltados para dentro, o condutor acaba por ser protegido da pressão aerodinâmica nos braços e ombros nas tiradas mais longas. Mesmo perdendo alguma facilidade do controlo na utilização em fora-de-estrada ou nas estradinhas de montanha mais reviradas. Onde é exigido um pouco mais de empenho nos braços para colocar a moto em curva. Ainda assim nada de extraordinário atendendo à geometria do trem dianteiro.
Uma caixa… de manteiga derretida
Uma nota para o bom conforto desta QJ Motor SRT700X, com banco suave, de consistência apta a tiradas de duas ou três centenas de quilómetros sem qualquer dificuldade e com os amplos poisa-pés cobertos com borracha oca. Que, apesar do bom tato, não filtram completamente as vibrações que escapam do bloco de dois cilindros paralelos. Sendo que, em regimes mais elevados, para lá das 6000 rpm, se estendem até ao banco. Mas sem nunca serem sensíveis ao nível dos punhos ou dos eficazes retrovisores.
Perfeitamente enquadrado num cenário de elevada competência global, o motor de dois cilindros paralelos e 698 cc revela grande aptidão em todo o tipo de utilização. Equilibrado e com boa resposta nas rotações mais baixas, permite acelerações fortes mas lineares, acompanhadas por uma interessante sonoridade de timbre metálico. Ainda assim, não podendo considerar-se um bloco de carácter muito vincado, é, isso sim, um motor de fácil utilização, nomeadamente em médias rotações. Afinal, nos regimes mais utilizados no dia-a-dia como em viagem.
A potência máxima de 73 cavalos chega às 8000 rotações por minuto, mas a verdade é que se sente desde bem mais cedo. Assim é possível acelerar desde as 2500 rpm sentindo de imediato uma resposta forte. E aproveitando o potencial do motor através de uma caixa de velocidades precisa, bem escalonada e, sobretudo, extremamente suave. Se já conhecem a expressão de caixas que parecem manteiga, pois bem, esta assemelha-se àquela manteiga derretida que se barra no pão com uma simples passagem da faca, sem qualquer esforço. Claro está que as boas companhias são sempre importantes e, neste caso, a embraiagem macia, bem desmultiplicada e com sistema de assistência, dá uma enorme ajuda. Mesmo nas estradas mais exigentes em termos de condução.
A importância das assinaturas
Itinerários onde o binário disponibilizado mostrou ser suficiente – pelo menos a solo… – com valor máximo de 67 Nm às 6500 rpm. E com um efeito de travão motor suficiente para uma condução rápida mas descontraída. Além disso, em caso de algum excesso, podemos sempre contar com os dois discos ‘wave’ de 320 mm de diâmetro na dianteira, assistidos por pinças monobloco da Brembo.
Com quatro êmbolos e fixação radial, proporcionam excelente feeling e elevada precisão, permitindo tirar o melhor partido da enorme potência de desaceleração. E sempre de forma facilmente modulável graças, em boa parte, à bomba radial com assinatura Brembo que acompanha a manete regulável. Em contrapartida, o elemento posterior, com disco de 260 mm e pinça de pistão simples, fica um pouco aquém do nível geral e até das necessidades. Menos preciso, revelou-se pouco mordaz no início para, quando se aumenta a pressão no pedal, revelar tendência a prender em demasia. Assim, em condução rápida e provocatória, o travão traseiro mostra alguma propensão a bloquear, despertando o ABS Bosch 9.1
Condução despachada potenciada pelos Metzeler Tourance montados, nesta versão da QJ Motor SRT700X, em bonitas jantes douradas com raios tangenciais. Pneus tubeless com piso que permite algumas escapadas em fora de estrada, filosofia reforçada pelas 19 polegadas da roda dianteira. Diâmetro que é bom compromisso para uma utilização mista em pneus que são eficazes em pisos de terra e garantem elevada confiança em curvas asfaltadas. E isto apesar de um peso de 240 kg e um centro de gravidade algo elevado que só a contida distância entre eixos (1505 mm) ajuda a disfarçar.
Malas de mais-valias
Aqui entra em jogo o conjunto de amortecimento, entregue a uma forqueta Marzocchi de 43 mm de diâmetro com fixação que revela equilíbrio entre rigidez e flexibilidade. Garantias dadas pela tripla fixação na parte inferior e apenas um parafuso na mesa superior que ajuda a meter a frente onde queremos, com elevada precisão. Além disso, à muita facilidade de colocar em curva junta-se a suavidade nas correções, mesmo se, num primeiro momento, se sinta alguma leveza da dianteira. Um pisar demasiado macio que pode ser ajustado graças à existência de regulação ao nível da compressão e da extensão. Já atrás é ajustável a pré-carga, em função da utilização com passageiro e das malas que são oferecidas durante a campanha de lançamento da QJ Motor SRT700X.
Oferta de kit composto por top-case de 45 litros e malas laterais de 35 L (esquerda) e 30 L (direita, por força do escape), a que se juntam o descanso central ou as proteções tubulares de série. Além da mais-valia que representam os 6 anos de garantia e um preço mais competitivo. Até final do mês serão 7990 euros em vez dos 8490 € de tabela, valor idêntico para a versão de 35 kW apta à carta A2 e válida para qualquer uma das três cores já disponíveis no mercado português.