A pista do Motorland de Aragão é o que de mais semelhante a um papel de lixa se pode encontrar nas pistas que integram o calendário do Mundial de Superbike. A proximidade a algumas áreas mais desérticas desta comunidade autónoma do nordeste de Espanha leva a que uma notável quantidade de areia se misture com a camada betuminosa do traçado, aumentando a sua abrasividade e desgaste infligido aos pneus.
Este é apenas um dos muitos problemas que a Pirelli teve de lidar ao longo dos 19 anos que leva como fornecedor exclusivo de borrachas para o Mundial e Superbike, que completa a bonita idade de 35 anos em 2022.
Qual é, então, a gama do fabricante italiano para a edição deste ano e o que representam as diferentes designações que vamos lendo e escutando ao longo de cada época?
- Texto: Fernando Pedrinho
- Fotos: Pirelli e Fernando Pedrinho
É certo que a pista de Alcaniz não atinge os níveis de castigo sobre as borrachas alcançados em Phillip Island, na Austrália, ou no AIA de Portimão, neste último depois do novo revestimento deitado há dois anos, mas o consumo do pneu traseiro é bem mais elevado do que o registrado numa pista ‘macia’ como a do Estoril. Com outros fatores a pesar no consumo e aderência do pneu, como a rugosidade do betuminoso, tipo de traçado e, muito importante, a temperatura da superfície, a areia trazida pelo vento acaba ainda por reduzir os níveis naturais de tração e aderência, que os técnicos da casa milanesa têm de ter em conta.
Soluções standard e de desenvolvimento
Durante o defeso e mesmo ao longo da época, o desenvolvimento dos pneus de ’Superbike’ é contínuo, na maior parte das vezes para responder a algumas queixas dos pilotos ou, em particular, de um ou mais construtores. Por exemplo, a extrema aderência dos SCX veio resolver de sobremaneira a característica falta de tração mecânica que quase todos os pilotos se queixavam face às Kawasaki oficiais. E foi isso que, em boa parte, ajudou a nivelar os níveis de prestações para os pilotos da casa de Akashi, ao mesmo tempo que permitiu aos ‘rookies’, como Andrea Locatelli ou Axel Bassani, sobressaírem.
Definindo pelo menos um par de soluções standard para a frente e para trás, a marca designa habitualmente os seus pneus por SC, de ‘Special Compound’, os quais podem ter diferentes níveis de dureza da borracha. Regra geral, menor temperatura do asfalto indica maior aderência, o que permite rolar com um composto mais duro e, por isso, mais duradouro. A porca torce o rabo quando o asfalto começa a aquecer e a moto a escorregar por falta de aderência. Aqui não há solução e o processo de mitigação passa por baixar a dureza do composto o qual, como se sabe, tende a durar menos tempo, colocando mais dificuldades aos pilotos para as últimas voltas.
Os pneus das Superbike
Vejamos o caso de Aragão. Na categoria de ‘Superbike’, a Pirelli trouxe duas soluções standard e uma de desenvolvimento, para a frente. O SC1 é o composto brando, e o SC2 o intermédio. A estes adiciona-se o A0674, utilizado no ano passado em Jerez de la Frontera e Portimão e muito apreciado pelos pilotos. Pela codificação não é difícil perceber que se tratou de um protótipo que após os testes foi aprovado e passou a integrar a gama, o que a marca chama de pneu de desenvolvimento. Neste caso particular, é semelhante ao SC1 mas com uma carcaça modificada para melhorar o ‘feeling’ da frente ao proporcionar melhor apoio na entrada e a meio da curva. Na primeira ronda do campeonato, os pilotos podem contar com oito pneus de cada um dos compostos mais brandos, e quatro do SC2 médio, todos na medida 125/70.
Refira-se que é procedimento habitual a Pirelli informar os pilotos que tipos de pneus de desenvolvimento vai levar para uma determinada sessão de testes ou até mesmo para uma ronda do campeonato. Havendo mesmo sessões específicas só dedicadas a ensaiar pneus – como sucedeu no ano passado, com a Pirelli a pedir ao Team HRC dedicação total para obtenção de dados e impressões – durante uma corrida a marca pode solicitar a alguns pilotos que rodem, na sexta-feira, com algum pneu de desenvolvimento que permita resolver alguma queixa específica, e recolher as suas sensações.
Pneu traseiro é crítico
Com tanta potência para passar ao asfalto, numa área inferior à de um cartão de crédito, o pneu de trás concentra a quase totalidade das atenções, pois dele pode depender a vitória ou uma derrota estrepitosa. Assim, para a roda ‘gorda’, a Pirelli disponibiliza o composto macio SC0 e o extra macio SCX, que no ano passado era um pneu de desenvolvimento codificado como A0557, que passou a ser o pneu mais usado desde a passagem por Misano. Como pneu de desenvolvimento surge agora o A1359, baseado no SCQ, e que por ter um composto ainda mais macio, deverá permitir melhores tempos por volta face ao SCX, algo que recebeu a aprovação da grelha nos treinos da pré-temporada. Todos eles na medida 200/65.
Para quando chove a sério ou chove mas molha pouco
Quando a chuva faz a sua aparição, os pilotos podem optar por pneus de chuva, para um piso molhado a encharcado, ou intermédios, quando o asfalto tem algumas poças e está húmido. Este, designado por SCW, é disponibilizado nas medidas 120/70 e 200/60, e caracteriza-se por apresentar menos canais de escoamento que um pneu de chuva e um composto que está a meio caminho entre um ‘slick’ e um pneu de chuva.
Já o Diablo Superbike de chuva, conhece o SCR1 dianteiro (120/70) e o novo traseiro (200/60), com a mesma designação, que era conhecido como X1251 no ano passado e foi utilizado de forma bem sucedida em Magny-Cours e Barcelona em 2021.
Classes intermédias também são gente
A introdução de motos de diferentes capacidades e número de cilindros que as tetracilíndricas de 600cc japonesas (e a 675 da MV Agusta) deverá aumentar a necessidade de uma maior atenção sobre a classe Supersport por parte da Pirelli.
Presentemente, a casa de Milão disponibiliza o novo SC1 macio, que deriva do A0460 de desenvolvimento, e SC2 de composto médio, isto no que se refere à roda dianteira, na medida 120/70.
Atrás, os homens das SSP podem contar com três opções ‘standard’, que se iniciam no super macio SCX e terminam no macio SC0 e médio SC1.
Para trás e para a frente de NT1100
Encontrar um sítio para dormir em Alcaniz durante um fim de semana de corridas pode tornar-se numa missão (quase) impossível. Este ano lá consegui desencantar um poiso numa localidade onde habitam pouco mais de 300 almas. Chama-se Monroyo, fica a 46 quilómetros do circuito e alguns deles reúnem-se ao final da tarde no bar da hospedaria para beber umas cervejas e comer tapas. Estranhei os sons que vinham das várias mesas. Situada junto das fronteiras com as comunidades autónomas da Catalunha e de Valência, aqui fala-se uma mistura de tudo. Até me disseram que nos lugarejos mais próximos as palavras mudam frequentemente. Trinta quilómetros para leste e só se fala castelhano, como em Alcaniz, a capital do Baixo Aragão.
Curiosamente, os mais jovens vêm de moto de enduro, todas a dois tempos, matriculadas. Estas montanhas são o paraíso do todo-o-terreno e julgo que serão precisos anos para voltar a repetir o mesmo percurso.
Albergado tão longe, a NT1100 está a ser obrigada a trabalho extra pela manhã e ao final do dia, algo que cumpre de forma imperturbada, enquanto a minha preocupação reside em mapear os radares fixos que espalham por um traçado sinuoso mas com algumas paisagens e vistas de povoados que nos obrigam a parar e a gravar na retina por muito tempo. Comparado com a chuva e o frio da edição do ano passado, feito com uma ‘naked’, desta vez está a ser um ‘passeio no parque’ e a permitir descontrair ao final da tarde e preparar a jornada de trabalho logo pela manhã.