Outono quente no Algarve, com a bruma vinda no Norte de África a dar um sabor de deserto a uma terra que, no passado, foi domínio de mouros e moçárabes. Momento ideal para encontrar o seis vezes campeão Mundial, Jonathan Rea, que tem pela frente o grande desafio de colmatar alguma vetustez da sua Kawasaki Ninja face a uma concorrência que não tem parado de evoluir.
- Texto: Fernando Pedrinho
- Fotos: Eva Blánquez, WorldSBK e Fernando Pedrinho
Jonathan Rea tem tido uma época bem árdua cheia de eventos e emoções fortes, como a queda em Assen, com o atual campeão em título, Toprak Razgatlioglu, ou o mais recente incidente com o atual líder do campeonato, Álvaro Bautista.
Mas, onde está o verdadeiro problema? Será que reside na Kawasaki Ninja? Estará a dominadora dos últimos anos a necessitar de uma renovação radical que devolva a Rea um pouco mais de competitividade que ainda vai colmatando com a sua pilotagem?
Velocidade máxima: falta ou não?
“Tecnicamente estamos numa situação melhor”, respondeu paradoxalmente o sorridente norte-irlandês. “A moto é boa e funciona bem. Mas falta-nos algo em áreas fundamentais, como a potência do motor e velocidade máxima. A travagem melhorou imenso e já não ando tanto no limite como acontecia no ano passado. A dificuldade é que, para o Álvaro (Bautista) e para a Ducati, há uma substancial diferença nas retas, comparando com o que acontecia com o Scott (Redding) na Ducati. Se a referência for o Toprak (Razgtlioglu), estamos lá, mas este ano a referência é o Álvaro e ele está à nossa frente em muitas áreas”.
Na longa reta de Montmeló, em Barcelona, a Kawasaki não perdeu muito em termos absolutos. “Ah, não te deixes enganar pelos números. Francamente, é exatamente o oposto. A velocidade máxima que alcancei foi tão elevada porque apanhei um cone de aspiração gigantesco gerado por duas motos. Tirando isto temos um défice de velocidade máxima de 10 a 12 km/h. Estou contente com as nossas prestações, mesmo sabendo que não ganho uma corrida desde o Estoril. Mas Portimão costuma ser uma boa pista para mim”.
Moto nova para 2023?
Mas vamos ao que interessa: a Kawasaki vai dar uma moto nova ao seu melhor piloto de sempre ou não? “F***-se, pensava que me ias perguntar quando é que penduro o fato, por isso obrigado por essa pergunta”, respondeu com um surpreendente ar de alívio e redenção. “É que toda a gente me pergunta isso, o que me deixa irritado de uma forma que nem imaginas (risos). A Kawasaki e a Provec têm trabalhado arduamente. Infelizmente necessitamos dar um longo passo em frente no que toca ao motor. Isso é evidente desde que o V4 [Ducati] chegou ao Mundial, em 2019. Precisamos do mesmo tipo de reação que tiveram a Honda e a BMW.
Em Superbikes estamos muito condicionados em termos de evolução ao modelo de série, a menos que uma marca se decida por um modelo completamente novo. A Kawasaki homologou um modelo novo em 2021, com novas peças do motor e uma aerodinâmica diferente, mas a FIM acabou por cortar tudo isso (ao não reconhecer a moto como um modelo novo e ao retirar o regime extra de 500 rpm que a marca havia solicitado). Este modelo tem apenas dois anos e acho difícil que eles lancem um modelo novo. No início da época achei que tinha a melhor moto da grelha, como se viu em Aragão e no Estoril, mas se pudesse pedir um presente no sapatinho para este natal seria mais potência. Para nos mantermos competitivos necessitamos de mais potência. E mais potência significa um novo motor!”.
O que prometeu a Kawasaki?
Rea renovou mais tempo com a marca a que deu seis títulos de pilotos e cujo nome surge imediatamente associado à casa de Akashi. O que prometeu a Kawasaki em termos de material mais competitivo e, sobretudo, de motor? “Essa discussão nunca aconteceu…” (prolongado silêncio).
Por isso, vai tudo ficar como dantes e Pere Riba, o diretor técnico da Provec e a Kawasaki vão ter de tirar mais alguns coelhos da cartola ao longo do ano. Mas quantos coelhos sobram ainda dentro da cartola? “Essa é uma boa pergunta”, ripostou o natural de Ballymena. “A equipa tem realizado um trabalho tremendo. Sempre que testamos, conseguimos melhorar qualquer coisa. Mas com as restrições que temos, a maior parte das evoluções que conseguimos surgem nas áreas relacionadas com a parte ciclística e a eletrónica. Só que o nosso ponto mais fraco é o motor… é como se estivesses na prisão, entendes? Acho que podemos sacar mais uns coelhos da cartola mas a Ducati elevou muito a fasquia, mesmo com as suas equipas satélite. A Yamaha já provou ter eliminado a diferença que nos separava e a BMW e a Honda estão a chegar”.
Vai ser tudo menos fácil, mas não é isso que torna este mundial tão apaixonante de seguir? Portimão é um circuito talismã para Jonathan Rea pelo que, desta feita, terá de ser ele a tirar o coelho da cartola e manter vivas as esperanças do mundial. Onde matematicamente já não depende apenas de si para poder alcançar o ceptro no final das quatro rondas que faltam disputar.
De Madrid a Portimão de BMW K1600GT
Foram 800 quilómetros redondinhos de Madrid ao AIA numa K1600GT da BMW Ibérica (gracias, Carmen!). Como seria de esperar, foi uma viagem feita com muita facilidade aproveitando as características estradistas e turísticas da seis em linha da casa de Munique.
Com uma média de 128 km/h, o consumo foi de 6,6 litros por cada 100 quilómetros percorridos, com total conforto e proteção aos elementos, acompanhado do ‘cantar’ do motor fracionado desta alemã, em muito a fazer lembrar o troar dos saudosos 635 CSI das corridas de turismo e silhueta.