Horwin CR6: desafio à liderança da mobilidade elétrica em duas rodas

Com a CR6, a Horwin lança mais uma seta apontada à liderança do segmento de motos elétricas no mercado nacional. Sob uma roupagem de ‘naked’ tradicional rematada com alguns elementos retro, o seu alvo é o utilizador mais conservador que procura identificar-se de imediato com o que uma moto convencional tem para oferecer, embora sob um pacote elétrico.

  • Texto: Fernando Pedrinho
  • Fotos: Alberto Pires

Há medida que os fabricantes de motos elétricas se foram deparando com as reações dos motociclistas e utilizadores perante as primeiras motos elétricas, algo disruptivas em termos de desenho e sensações face a um conceito que perdura há mais de um século, o ajuste da estratégia para este segmento – em claro crescimento de importância –  enveredou pelo desenho e conceção de modelos mais aproximados dos cânones estabelecidos durante dezenas e dezenas de anos de como uma moto se deve parecer e fazer sentir.

Foram vários os projetos e marcas que ‘morreram na praia’, alguns deles porventura a surgirem demasiado cedo para um mercado que não estava consciencializado dos benefícios deste tipo de motorizações. Desenho, nível de prestações, preço de comercialização e desempenho das baterias foram, não raro, os derradeiros pregos nos ‘caixões’ dos vários projetos falhados.

Mas com a mudança de paradigma liderada pela Europa e pela China – para as suas mega-urbes – os motores de combustão tradicionais têm um prazo de vida pouco superior a 10 anos. Isto é algo que ainda veremos se será mesmo assim (a nível de alguma modificação deste objetivo, sobretudo se o hidrogénio ganhar protagonismo como combustível alternativo aos de origem fóssil, mas isso é assunto para outro artigo sobre o tema). Contudo, de momento, a eletricidade é a rainha e para onde todas as motorizações de veículos para uso pessoal, e não só, estão a convergir.

Se os novos motociclistas, de alguma forma bastante mais novos, tendem a olhar para aspetos mais relacionados com a tecnologia e conetividade, economia e ausência de ruído, já os provenientes dos modelos ditos convencionais, com motores de combustão, ainda procuram semelhanças ao nível do desempenho e de uma sensação mais gutural, como o som de funcionamento, a vivacidade transmitida pelo motor e, obviamente, o preço de aquisição.

Neo-clássica

Confesso não ter ficado ‘esmagado’ pelo seu impacto visual, mas esta CR6 apresenta-se debaixo de uma silhueta clássica, que mistura elementos de ‘naked’ e ‘café racer’, bem evidentes no assento de pegas e traseira minimalista rematada por um aro de cromado que serve de pega para o passageiro, como já havíamos visto na sua maior rival, a Super Soco TC Max.

Porem, a Horwin dá mostras de ser uma marca rápida a reagir e basta ver a evolução estética que a novíssima SK3 exibe, com linhas futuristas, angulosas e devera apelativas, bem diferentes das rechonchudas curvas das ‘irmãs’ EK3. Isso deixa alguma curiosidade no que poderá ser a sucessora desta CR6, que não se poderá chamar CR7, pois esta designação está registada como propriedade do senhor Cristiano Ronaldo dos Santos Aveiro!

Voltemos à CR6! A semelhança com uma moto convencional é das mais conseguidas do mercado, já que o travão traseiro é acionado por pedal e a transmissão da potência à roda efetua-se por corrente a partir de um motor colocado em posição central. Tal qual como numa moto de motor de combustão!

A situação é levada ao extremo pela sua irmã, CR6 Pro, que não é comercializada em Portugal pelo preço elevado com que chegaria ao mercado. Na Pro, a manete esquerda serve para acionar a embraiagem e um seletor acionado pelo pé esquerdo permite mesmo a utilização da caixa de cinco velocidades com que vem equipada. Aqui, devo confessar que muito gostaria de experimentar a passagem de caixa por instrumentos (leia-se taquímetro, ou conta-rotações) pois um motor elétrico não ‘fala’ connosco como um mais expressivo a gasolina.

De resto, sem poder aproveitar a beleza que se reconhece nos motores de combustão e seus periféricos, como um simples sistema de escape, os criativos da Horwin seguiram a tendência atual de integrar e disfarçar nas linhas gerais da moto os seus componentes elétricos, que pecam pela falta do lado escultural de um motor de êmbolos. Olhem para o quadro e digam lá se não vos traz à memória a ‘velhinha’ Suzuki GS500, com diversas áreas cobertas que apenas deixam ver as tampas laterais do motor e as alhetas de arrefecimento do controlador da bateria, mas sem uma beleza intrínseca propriamente dita.

Um toque de personalidade é dado pelo farol dianteiro, que nesta moto surgia com uma grelha de proteção opcional, ao melhor estilo ‘scrambler’.

Espaço com fartura

As semelhanças com uma moto convencional não ficam por aqui. O painel de instrumentos é dominado por um enorme conta-rotações analógico e complementado por um ecrã mais pequeno, de cristais líquidos, que gera a informação adicional habitual: velocidade de circulação, carga da bateria, autonomia disponível ou modo de motor. Bom, por esta altura, mesmo o mais indefetível defensor dos modelos a gasolina já deve respirar, de alguma maneira, de alívio.

Jogando muito a seu favor, esta moto proporciona bastante espaço para as pernas do utilizador, o qual adota uma posição de condução muito natural graças a um guiador suficientemente largo e encurvado para colocar os punhos numa posição mais elevada. Nota-se, ainda, a já referida ausência da manete esquerda. Os comutadores são bastante simples, com o seletor de modos de potência do motor a surgir do lado direito.

O lado psicológico que facilita a sua aceitação advém da sua largura e a sensação reconfortante de algum peso, que a ‘planta’ sobre o asfalto, sem, contudo, interferir com a sua maneabilidade ou até nas manobras a baixa velocidade.

A parte ciclística é facilmente reconhecível em qualquer moto que se veja circular no dia-a-dia, seja na transmissão por corrente, nos travões de disco em ambas as rodas, no sistema de amortecimento progressivo da traseira ou na forquilha invertida que domina na frente. Mesmo sem exibir um sistema de escape, os mais distraídos poderão nem reparar que se trata de uma moto elétrica.

Bateria integrada em permanência

A CR6 recorre a um comando remoto para ligar e desativar o sistema antirroubo, que inclui, não obstante, uma chave que se pode utilizar de forma convencional e permite também trancar a direção. Um ponto muito positivo ao abdicar de um sistema Neiman (tranca lateral) que pode provocar surpresas desagradáveis no momento de arranque, quando estamos com mais pressa ou distraídos.

No interior do falso depósito deparamo-nos um compartimento com fechadura e uma capacidade de armazenamento superior ao esperado e que se revela bastante prático.

Este modelo tem a particularidade de não permitir a retirada da bateria que utiliza pilhas Panasonic 18650 de iões de lítio, mas incorpora no seu interior um carregador (relativamente) rápido, para ligar-se a uma tomada monofásica convencional de 220V, a partir de uma entrada colocada no lado esquerdo do quadro. A Voltstore, importador nacional da Horwin, de forma inteligente comercializa uma tomada T2 que permite recorrer às estações de carregamento – para o caso de não haver um ‘café mais à mão’ – mesmo sem permitir beneficiar das opções de carregamento rápido que alguns destes pontos disponibilizam.

Um disjuntor, cujo botão surge escondido sob a tampa esquerda, permite desligar qualquer fornecimento de corrente em paragens mais prolongadas, como sucede com transporte marítimo destas motos entre a China e a Europa, por exemplo.

Imanes permanentes e controlo vetorial

Com uma capacidade de 72V e 53 Ah (ou 3,8 kWh), a bateria dispõe as suas células dentro de uma cápsula blindada que as protege de vibrações e impactos. O compacto motor síncrono de ímanes permanentes entrega 5,3 kW (7,1 cavalos) de potência, pelo que a CR6 é equiparada a uma 125cc.

Motor compaxcto totalmente escondido pela tampa esquerda.

Este tipo de motor é dos mais utilizados entre os trifásicos de corrente alternada. O motor recebe este nome porque funciona a uma velocidade síncrona, que é constante e tem uma sincronia com a quantidade de polos e a frequência da corrente de alimentação. Trocando por ‘miúdos’, a velocidade do motor será igual à da rotação do seu campo magnético. E tal como num motor de indução, contém um rotor interior e um estator que o envolve, mas um íman permanente é utilizado no rotor para gerar o campo magnético, o que dispensa a utilização de bobinas naquele elemento rotativo. São também conhecidos como motores trifásicos sem escovas de onda sinusoidal permanente. 

A Horwin recorre ainda ao controle de campo orientado do motor, tão em moda entre os motores elétricos, mais conhecido por controle vectorial. De uma forma muito simplificada, o que se gere com este sistema é a magnitude e ângulo de cada fase da corrente e da sua voltagem. O resultado é um motor com uma resposta pronta, fácil de utilizar a baixa velocidade (sem os ‘sacões’ do passado), mais pequeno, barato e com menor consumo de potência.

Como peixe na… cidade

Acusando 134 kg na balança (107 kg sem a bateria) a cidade é o seu local ideal de utilização. A capacidade de aceleração é a que se reconhece aos motores elétricos e que nos levam, no primeiro modo de utilização até aos 60 km/h, quando se roda ainda abaixo das 4.000 rpm. Com um assento distando 870mm do asfalto, na CR6, basta ligar a ignição, premir o botão de arranque que faz acender a luz ‘ready’ no painel de instrumentos e acelerar, como na mais simples das ‘scooters’, mas tendo em conta que o travão traseiro é acionado pelo pedal (situado no lado direito).

A utilização em percursos interurbanos está perfeitamente ao seu alcance, pois em condições favoráveis consegue-se atingir 103 km/h às 6.000 rpm. Contudo, a utilização em autoestrada pode resultar algo traumática devido às perdas de perdas de velocidade quando há que vencer desníveis, que nos podem tornar presa fácil de qualquer camião. Acresce ainda a falta de capacidade de aceleração no caso de uma ultrapassagem, que deve ser bem calculada, pois a potência disponível é a que se sabe e o seu peso não a coloca entre as mais ligeiras da categoria. Pior ainda se transportarmos passageiro, o qual poderá sentir-se um nadinha apertado dada rampa na parte final do assento e uns poisa-pés algo elevados.

Ciclística em bom plano

As suspensões recorrem a uma forquilha invertida na dianteira e a um monoamortecedor de ação direta, regulável na pré-carga de mola mediante um sistema de porca e contra-porca. O seu desempenho está em bom plano e cumpre com o esperado na maior parte das situações.

A travagem recorre a um disco em cada roda (265mm, à frente, e 220mm na roda traseira), ‘mordidos’ por uma pinça de dois êmbolos, na roda dianteira, e de êmbolo simples na roda oposta. Com um sistema combinado, a capacidade de desaceleração é poderosa, mas voltamos a notar a falta de um sistema de anti-blocagem, como se tem tornado hábito entre as pequenas elétricas originárias da China. Uma lacuna que urge corrigir nos futuros modelos!

Os pneus CTS de nylon (100/80 e 120/80, montados em jantes de 17” de diâmetro, de liga leve) oferecem boa aderência em todas as situações, embora não tenhamos andado à chuva. De tal modo que a moto pode bater no asfalto nas curvas para a esquerda com algum estrépito.

Entre outros aspetos práticos, bons retrovisores, mas o mesmo não se pode dizer da capacidade de iluminação dos médios, algo que a luz de máximos compensa de alguma forma.

Menos de um euro por cada 100 quilómetros?

E a autonomia? Como todos sabemos, isso vai depender da forma como se utilizar a CR6 mas conseguimos valores entre os 70 e os 110 quilómetros, não longe dos 120 quilómetros anunciados pela marca, com um custo por quilómetro que é deveras económico para quem tem de fazer contas à vida, variando entre os 80 cêntimos e 1,5 euros por cada centena de quilómetros, sendo este último em via rápida e efetuado de punho a fundo. A Horwin anuncia capacidade de regeneração na desaceleração, mas apesar de várias tentativas não vimos qualquer incremento na capacidade da bateria, apesar de se sentir algum travão-motor quando cortamos acelerador.

É possível carregar 80% da carga em três horas, mas a nossa recomendação é para que o façam algum tempo depois de utilização do veículo, permitindo que a bateria arrefeça e se ganhe alguma eficiência (e tempo) no processo de carregamento. Convirá referir que o carregador rápido se encontra incorporado na moto, com a tomada de corrente situada na trave esquerda do quadro, de onde se ligará a uma tomada caseira monofásica de 220V ou, como referido acima, a um carregador rápido mediante o adaptador comercializado em separado.

Refira-se, ainda, que a garantia é de dois anos e cobre a bateria. As manutenções rondam os 40 euros quando realizadas na Voltstore.

Para o segmento das elétricas de 6.000 euros

Bastante semelhante e fácil de interiorizar como uma 125cc convencional, a Horwin CR6 procura uma clientela mais madura em busca de uma solução elétrica numa entrada de gama que não passe pelas inevitáveis ‘scooters’.

A CR6 tem espaço, uma linha discreta e agradável, cumprindo a sua função em ambiente citadino e interurbano, com um conforto e desempenho mais que aceitáveis, estando menos à vontade nas vias rápidas e autoestradas.

A bateria e carregador integrados têm vantagens e inconvenientes mas permitem obter uma boa parte da carga em três horas.

Assim, a CR6 é o que de mais semelhante se poderá encontrar a uma moto convencional entre os modelos de entrada de gama, só que elétrica e em versão ‘acelera’.

Comercializada pela rede de distribuição da Volstore ao preço de 6.600 euros, a CR6 é uma opção definitivamente a ter em conta para aqueles que estão a considerar a sua reconversão à mobilidade elétrica.

Fique a saber algo mais com o filme que preparámos sobre este modelo.

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