Honda CBX 1000. O fator WOW !

Em meados dos anos 1970 a Honda estava numa encruzilhada. A performance desportiva, a qualidade dos seus produtos e o reconhecimento enquanto marca eram indiscutíveis, mas quando se olhava para os seus modelos os olhos não brilhavam com a intensidade correspondente. Algo tinha que ser feito!

  • Texto e fotos: Alberto Pires

É com este objetivo em mente que o diretor de R&D da Honda, Tadashi Kume, resolve entregar a Shoichiro Irimajiri a tarefa de criar um modelo que fizesse a diferença, que fosse o porta estandarte da capacidade tecnológica da marca, estabelecendo uma nova referência e não deixasse ninguém indiferente. A escolha desse engenheiro para liderar o projeto tinha uma razão objetiva. Apesar da sua idade, 37 anos, tinha já no seu currículo a criação de quatro motores de GP extraordinários, o bicilíndrico de 50 cc, o 125 cc de cinco cilindros e os de seis cilindros da 250 cc e 350 cc. Não é assim de estranhar, antes pelo contrário, que a decisão para configuração do motor tenha recaído num enorme seis cilindros em linha!

As suas características técnicas eram vincadamente desportivas. Era a mais potente do mercado à altura do lançamento, declarando 105 cv às 9.000 rpm. Comparativamente à CB 750 F com capacidade unitária semelhante, o diâmetro dos pistões era maior e o seu curso menor, disponibilizando assim espaço para válvulas de maior diâmetro, e montava carburadores Keihin CV 28, os mais sofisticados na época e reconhecidamente capazes de proporcionar grande fluidez na resposta. A luta contra o peso esteve sempre presente. Como o seis-em-linha é naturalmente equilibrado Shoichiro Irimajiri não necessitou de adicionar contrapesos na cambota. Mas não se ficou por aqui: as árvores de cames eram ocas, recorreu ao alumínio para muitos dos suportes e ao magnésio para quatro das tampas no motor. O plástico foi também uma alternativa para algumas das peças, como o guarda lamas dianteiro, e as jantes em alumínio Comstar eram mais leves cerca de dois quilos que as equivalentes de raios.

O respeito no primeiro contato é proporcional ao seu peso. Afinal, com os 20 litros de gasolina que o depósito pode acolher o seu peso anda nos 272 kg. Também é larga, o que dificulta o manuseamento, e se a deixamos passar de determinada inclinação a desgraça é inevitável. Para colocar o motor em funcionamento, a frio, é fundamental fechar o ar e deixar aquecer um pouco antes de arrancar. A embraiagem é macia no que é bem acompanhada pela caixa , sentindo-se imediatamente a disponibilidade envolvente do motor. Com 30 Nm de binário às 2.000 rpm, e uma aceleração fluida, não sentimos necessidade de ultrapassar as 3.500 rpm para trocar de caixa, e é num instante que engrenamos quinta, entrando então em modo automático. Se muito devagar parece que estamos a tentar mover uma mesa de jantar na sala, em movimento entramos numa espécie de dança a dois, como se tivesse metade do peso e cilindrada.

Em estrada aberta, a aceleração em quinta, sobretudo quando nos começamos a aproximar das 4.000 rpm, rapidamente se torna viciante. O silvo aveludado torna-se mais possante e num ápice estamos nos 120 km/h, momento em que tudo se começa a complicar, progressivamente mas de forma assertiva. O comportamento desportivo do motor é evidente e mostra apetite por rotações, estando o red line colocado nas 9.500 rpm, 500 rpm acima do momento do regime de potência máxima. É contudo resistente, já que em testes rodou às 11.000 rpm durante meia hora e só partiu um parafuso da culassa! O princípio da prudência aconselhou-me a não ultrapassar os 150 km/h, mas o seu proprietário, o João Claro, levou-a recentemente aos 200 km/h. Ou seja, podemos apertar com o motor para logo perceber que a limitação está na ciclística. Se o piso estiver em muito boas condições apenas sentimos a frente um pouco leve, caso contrário começa a oscilar de traseira e a perder a compostura. É então que nos lembramos que a suspensão dianteira tem apenas 35 mm de diâmetro, o mesmo que as NSR 125 que corriam no Troféu Lubritex em 1987, e que os pneus são Metzeler Lasertec, 100/19 na frente e 120/18 na traseira!

Curiosamente, gostei de andar em cidade com pouco trânsito, sentindo-me confortável a serpentear pelas filas. Senti também alguma vaidade ao olhar para as montras mais escuras, por gostar da imagem refletida. No fundo, era essa a razão dos olhares e a explicação para a forma como me seguiam. A CBX foi feita para impressionar e continua a não passar despercebida.

Os primeiros anos a seguir ao seu lançamento foram difíceis. Era mais cara que as concorrentes e obrigava a uma manutenção exigente e dispendiosa. Talvez por não estar bem definido o seu posicionamento, era uma presa fácil tanto na comparação com as desportivas como no confronto com as turísticas. No segmento das extravagantes sofreu também com o impacto da Z1300, igualmente com seis cilindros, que esgrimia a vantagem de ter refrigeração líquida e ser ainda maior. Durante duas décadas foi alvo das maiores atrocidades, que culminou com a cobiça pelo seu motor para configurações ‘café racer’. Só nos últimos anos é que começou a ser devidamente apreciada, sendo cada vez mais valiosa sobretudo no seu estado original. Hoje é um valor seguro, sendo já considerada como um ativo de investimento.

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